Quando eu iniciava os primeiros passos em propaganda - em meados do século passado - havia um chavão, importado dos EUA (que era, ainda, onde tudo acontecia), que dizia o seguinte: quando você não tiver uma boa idéia para um anúncio, utilize uma foto - de criança, cachorro ou mulher bonita, nessa ordem.
Tenho assistido à nossa TV aberta, com alguma regularidade e, pelo menos nos horários em que estou diante da telinha, há uma epidemia - ou inflação - de comerciais que se utilizam de crianças, como artifício para chamar a atenção ou despertar a simpatia do público espectador. As crianças brasileiras que aparecem em filmes - tanto comerciais como longas - são terrivelmente antipáticas. É menos culpa delas, do que dos nossos diretores, que são sofríveis - e é também função da inexistência de bons atores, no país. As novelas da Globo nos condicionaram a um baixo nível de representação - de teatro ginasiano - que é disfarçado pelos artifícios tecnológicos. Mas somos péssimos, nessa área, em especial quando nos comparamos aos sofisticadas padrões ingleses e americanos.
Mas - voltando ao aspecto criativo - imagino que esteja, mesmo, muito difícil, atualmente, conseguir que os timoratos rapazes e moças que ocupam a maioria dos cargos de marketing nas empresas aprovem boas idéias, altamente criativas. É mais prudente levar o arroz-com-feijão, mesmo: gracinhas, trocadilhos... e crianças.
Se é esse, mesmo, o problema, confesso que gostaria de ver mais cachorros e mulheres bonitas. As crianças estão cansando; são tão chatas e ardidas.
E há uma outra questão, que nunca vi levantada, nem aqui no Brasil, nem em outros países, e que é a seguinte: será que é legal usar crianças na propaganda? Não falo de "legal", mas legal mesmo.
A lei brasileira proibe o trabalho infantil. Quando eu jogava tênis regularmente, tínhamos - no clube - uns meninos que defendiam uns trocados pegando as bolas e, um dia, bateu lá uma brigada do Ministério do Trabalho e quase encanou todo mundo. Passamos a pegar as próprias bolas e os meninos perderam as chances de se tornarem novos Gugas.
Mas o Código Civil é claro. No artigo 3, livro I, está escrito: "são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os atos da vida civil (...) os menores de 16 anos". E, mais adiante: (art. 5, parágrafo único) "Cessará para os menores, a incapacidade, I - pela concessão dos pais (...) se o menor tiver 16 anos completos". Então, é claro que os menores de 16 anos não podem exercer funções profissionais remuneradas, em nenhuma hipótese, nem dar qualquer testemunho público a respeito das qualidades de bancos comerciais, seguros, refrigerantes, lojas de varejo ou automóveis.
Acho curioso que ninguém ainda se tenha dado conta disso. Talvez porque a pieguice nacional é tanta, que o encanto geral por essas criancinhas comercialmente manipuladas sufoque a justa indignação que nós todos deveríamos estar sentindo. Mas começo a desenvolver a certeza de que crianças na propaganda são ilegais e deveriam ser proibidas.
crianças ilegais do J. Roberto Whitaker Penteado. mais do mesmo no www.jrwp.com.br
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