sexta-feira, dezembro 16, 2005

terra onde até restaurante fecha para o almoço

joão pessoa é cidade injusta para com os paraibanos.

não estou falando aqueles que didi mocó ajudou a estigmatizar como. símbolos da miséria caricata em pobreza estética, existencial e alimentar. assim tornados paraíbas, classificação pária. ascendida ao vocabulário nacional pós-ascenção dos baianos. antes os paraíbas da vez, e que sairam debaixo dos pregos do tacão que os classificava de malemolentes e vezuseiros de toda sorte de gozação - "televisão de baiano é janela de trem". pois. ficou difícil contrapor quaisquer outra valoração após a tomada do cenário nacional por caetano, gil, gal, bethânia, novos baianos,etc e chics mais. ser baiano tornou-se cool. por méritos próprios diga-se de passagem. onde até a negritude é valorativa ainda que seu brilho não torne opaco o preconceito. e tome o baiano burro nasce morto, baiano não nasce estréia.

a injustiça de joão pessoa com os paraibanos é a da beleza da terra e suas possibilidades que finda como abrigo e reprodutório das fístulas de coronelismo de asfalto e classe média pendurada nas mamatas descomunais que habitam a capital. onde não se sente o cheiro mais execrável da tramóia porque talvez segunda cidade mais arborizada do mundo. perfume agredido. a começar das colunas sociais, onde o arrivismo do pandeguismo fotográfico mistura-se com o sotaque de uma semana em miami nas caras clones de museu de cera de madame.

joão pessoa, fez me ver serventia na bomba de neutrons. soltava-se uma lá. preservava-se a natureza. o resto de casario da terceira cidade mais antiga do brasil, ao custo do sacrifício de algumas boas cabeças é verdade. mas infelizmente não pouparia-se a vida dos animais de casa ou de rua, que decididamente não merecem pagar pelos donos do seu abandono. tal qual cidade onde o crescimento desordenado - a questão dos edifícios na orla é apenas fachada - vai tornando-a abjeta. da cloaca do rio palafita ao canal de esgoto na praia. suspenda-se a explosão, mas não o desabafo.

o intróito, preâmbulo, prolegômeno, faz parte, da série seguindo "a mala do ricardo freire". caso você não saiba, ricardo fez parte da geração oiro de porto alegre – mercado ainda cheio de pepitas – que migrando para são paulo, viria a se tornar sócio de olivetto na propaganda registrada. começo arrasador, desenvolvimento frustado. no meio do caminho, freire começou a viajar demais e acabou gostando. tornando-se turista profissional e fazendo disso meio de vida, o que convenhamos, não é nada mal.

ricardo freire teve em joão pessoa e postou algumas de suas impressões no seu blog. como todos, quem não fica? pasmou-se com o por de sol na praia do jacaré e ainda mais, ao que parece, com o solo do bolero de ravel na coreografia cada dia mais aperfeiçoada do jurandir que larga de pier próximo e encerra a peça, o bolero, no cais do bar que o abriga, ainda jacaré? no exato momento em que o sol se despede em meio ao júbilo total, aplauso e assovios ao músico figurino branco, barbas à ermitão.

ví o espetáculo, como turista e morador da própria terra. impressiona é verdade. mas arrepios mesmo sentia quando o bolero ainda era na base dos chiados do vinil, no então jacaré bar da nôra. algumas vezes em companhia do zito, zitello para os íntimos, sessão muito particular, cimeira da laje da antiga fábrica de gelo que resultou no bar. nunca perguntei que gravação orquestra ou maestro, deixando sempre para a próxima vez, esperando até o vinil furar. furou ?

outros tempos, outras impressões, outras medidas. joão pessoa foi uma cidade durante muito tempo vítima da proximidade a recife, da falta de infra-estrutura do aeroporto, de restaurantes que turistas encontravam fechados a hora do almoço. tanto assim que bons hotéis tornaram-se colégios e repartições estaduais. somado ao desgaste das práticas coronelísticas locais que sempre trataram o turismo como algo menor. grande apenas na alocação de protegidos e envelopados. que fizeram mais por sí, pelo menos a curto prazo, do que pela cidade que tem muito mais a mostrar do que o que se vê. principalmente por suas campanhas e informações turísticas.

oxalá, alguma coisa tenho mudado para além do fim do vinil. até porque com pipa arrastando multidões de um lado, porto de galinhas de outro, joão pessoa corre o risco de ver sua estagnação enquanto destino turístico pari passu a estagnação do seu quadro político e da sua novenada riche de veraneio.que se ontem a tornava a terra onde restaurantes fecham para o almoço, fazem de tudo para torná-la a terra do nunca ?

com pesar, ainda maiores que a saudade, reafirmo que joão pessoa continua injusta com os paraibanos que a administram e parte que a habita. dando-lhes tanto, e recebendo deles, ainda menos que gorjeta, atenção.

2 comentários:

Anônimo disse...

Celso,

Quando ainda na Austrália, ouvia muito dizerem que aquilo era o Brasil que deu certo.

Não é tão diferente a impressão que tenho quando olho Floripa, em relação à João Pessoa. E é mesmo triste perceber que não tenho nenhuma vontade de voltar a morar lá. Não nos próximos 10 anos, pelo menos.Quiçá na minha aposentadoria, mas receio que daqui pra lá já terei virado um manezinho.

Como consolo, devo dizer que sinto muita falta do carangueijo, dos caldinhos na praia, da água de coco barata e da água morna do mar (apesar do sargaço).

Abraço.

celso muniz disse...

meu caro andré:

só mesmo na austrália pro brasil dar certo.
por aqui, nem levados por pontapé de cangurú nos ovos pra se tomar a vergonha de que não estamos no caminho acertado. caminho que equivale a algum dia ter tido a idéia de que os diabos da tasmânia que estão se tornando os menores abandonados tratados com o carinho da febem ainda acabam por vir a ser cachorrinhos de madame.

joão pessoa ainda possibilita uma qualidade de vida bastante razoável se você tiver algum e muito saco para aguentar o societé local. já não mais pacata, perdendo as boas coisas da outrora cidade pequena e ganhando todos os defeitos de cidade grande, bala na nuca desbancando a peixeira no bucho, incluindo a peculiaridade de uma péssima qualidade de pontos de vista, dos come-comes locais e, ainda pior, dos atravessadores e lambe-cus do poder, sem falar num mercado publicitário de pulgas e um jornalismo de borra.
some a isso um esquema de corrupção que vai completar bodas valiosas, de fazer o marcos valério corar e de arregalar os olhos "do lin chong", que se tem uma joão pessoa que vai se perdendo a contra-gosto de gente que a encontrou e imaginou alí ter encontrado o paraíso.
quanto aos trincados e água de coco baratas há quem jure que aquilo que se parece com sargaço já não mais é: pois sargaço não bóia.

seja manezinho, mas não seja mané, como diria o copy.
já bastou ter voltado da austrália, aqueles país onde eu "perdi as botas" :).
caranguejo por cararanguejo não vale a pena comer bicho que anda pra trás.
tente as lebres, em pomerode, quiçá.
grande abraço.