1. Estava cansado mas contente, naquele fim de dia. Tinha cumprido todas as missões que lhe foram confiadas, quebrado todos os galhos da agência, resolvido problemas intrincados.
“O presidente deve estar feliz com meu trabalho. Quem sabe, ganho um aumento.”
Aí, o telefone tocou. Era o presidente, convocando-o para uma reunião. Sentiu-se importante: “se ele me convida a essa hora, é porque confia em mim.”
Ficou chocado com o que o presidente lhe disse:
“A partir de amanhã você não precisa vir. Está despedido.”
“Eu?!”
“Você.”
“Mas por que?”
“A agência precisa economizar.”
“Mas eu ganho tão pouco...”
“Esse pouco é muito para a agência.”
“É, mas o senhor vai ter de contratar alguém.”
“Vou não. Promoverei a telefonista.”
“Ela não é publicitária.”
“A partir de amanhã será.”
Atônito, saiu da sala do presidente, sentou-se na escada, desolado.
“Puxa vida, dei a vida por essa agência, fiz tudo o que me foi pedido, nunca reclamei de nada, nunca pedi nada. Agora...”
Enquanto chorava, dentro da sala o presidente tomava um gole de uísque, feliz:
“Fiz o que devia fazer. Esse banana nunca teve voz para nada. Eu falava, ele concordava. Eu mandava, e por mais ridícula que fosse a ordem, ele fazia, calado. Quem cala, consente. Detesto isso.”
2. Elio Gáspari, na coluna que mantém na Folha de S. Paulo publicou (dia 4 último) interessante artigo sob o título Um golpe anunciado na Venezuela. A exemplo do que fez a maioria dos outros analistas internacionais, criticou a oposição venezuelana por decidir não participar das eleições naquele país. E encerrou o artigo, afirmando:
“O absenteismo produz desastres. Há 42 anos a esquerda venezuelana, inspirada pelo radicalismo cubano, boicotou uma eleição, metralhou eleitores e danou-se. Em 1924, depois do assassinato de um deputado socialista, a oposição italiana abandonou o Congresso e instalou-se o Monte Aventino, onde a plebe romana se revelara em 494 A.C. Erro. Benito Mussolini aproveitou o episódio e radicalizou a ditadura ao fim da qual penduraram-no de cabeça para baixo num posto de gasolina de Milão.”
3. O que tem isso a ver com as calças? Tudo.
Fico observando, pasmado, a indiferença dos publicitários diante dos problemas que afligem o setor e o prejudicam diretamente. Estão deixando tudo para as entidades patrocinais Abap, Fenapro, Sindicatos de Agências. Abaixam a cabeça em um tenebroso silêncio. Em um permanente yes sir que cada vez mais contribuem para solapar suas oportunidades de crescer.
Como disse aquele personagem (real) que citei lá em cima. “Quem cala, consente.”
4. O que me deixa mais perplexo é ver que isso acontece em um momento em que o setor caminha sem rumo, por absoluta falta de uma liderança autêntica. Falta de liderança, aliás, reconhecida por Roberto Duailibi:
“Para atravessar este momento difícil que caiu sobre a publicidade é preciso encontrar lideranças. Está faltando aos publicitários lideranças fortes para representá-los no governo em todos os forros em que estas questões atuais são debatidas. Não podemos ser confundidos com figuras desconhecidas que de repente surgiram na cena política com o publicitário.” (Gazeta Mercantil do dia 6)
5. Está certo, pra variar, o Roberto. Só que liderança não é concedida, é conquistada. E a conquista se faz na labuta diária e nos grandes eventos. Como aquele Congresso que as “lideranças” atuais proíbem.
E proíbem, porque os publicitários permanecem calados. Como tal consentem que esta situação se prolongue – e que os problemas continuem se agravando até o dia em que seremos todos colocados no olho da rua.
eloy simões. empregando a técnica do prego e martelada de sempre, sempre no mesmo lugar.
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