domingo, dezembro 18, 2005

alegrias de um homem triste ou terapia do abraço

ganido e folks abraçam-me sempre, sempre. como se fosse para sempre. invariavelmente. mesmo que nossos encontros repitam-se num vai e vem sem fim ao longo do dia.

ganido é vira-latas. do tipo mais vulgar que se conheçe. vulgar no sentido de comum da raça. para mim, mais que nobre, é o supérfluo que se tornou superlativo do essencial. e isto basta para descrevê-lo para além da sua habilidade quase atlética de fazer barras nas grades do terraço apenas para me ver.

preto, mancha branca no peito. surgiu numa dessas épocas de cio. nós ainda moradores da enseada dos corais. surgiu e foi ficando, depois de muitos ganidos, resultantes das coças que levava dos oponentes. daí o seu nome: ganido. até que ficou de vez, como o nome

folks, pêlo castanho, olhos castanhos amarelos. ares de vivaldino e andar cambalhotado. no seu bom humor inclui a lorota do seu grunido de cachorro zangado.

cabia na palma da mão quando chegou-me. ferida que ainda assim não chorava. cuidei e não ficaram sequelas do enxotamento por água fervente. senha de entrada ao humano mundo cão, folks pagou bilhete de adulto. o que é cruel demais para quem apenas mês de idade mal tinha. tudo porque, na falta de peito da mãe, quem sabe por desgraça ainda maior fustigada, procurou guarida à porta de outra espécie tornando-se prova em carne viva de que há gente muito pior do que parece bicho.

ganido e folks, tem porte médio e coração que salta-lhes pela boca. seus abraços afetuosos são o que de mais construtivo conheço. ainda que animais sejam. tenho consciência, eles ainda bem que não, e somam-se as partes, encaixe mais-que-perfeito da amizade.

se ainda não compreende o quê de tão especial há no abraço dos dois, poupo-lhe o desinteresse de ombros que há de usar: em seus abraços, não há tapinhas nas costas. é puro abraço, sem medo de hálito ou lambidas, contatos ou exageros. cheios de tato, olfato e afeto, abraços hoje quase réstia, não mais, entre filhos e pais. saudosos, dos amigos que não mais dão em amigos. e da enorme distância que há nas proximidades dos abraços superficiais.

ainda assim, ganido e folks, vivem separados, pois costumam brigar ensadecidamente a não mais segurar.

talvez porque eles mesmo nunca tenham se abraçado nem ao menos cogitado tentar.

assim, alegro-me por ter os seus abraços. e entristeço-me, por não os ter em par. perfeitamente encaixados, como estão na minha vida, título e assinatura de um lar.

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