A memória curta do brasileiro permite uma reedição de golpes corporativos à moda da extinta Fazendas Reunidas Boi Gordo.
“Conheço gente que perde mais tempo comparando quando compra toalhas de papel do que quando faz investimentos.”
(Arthur Levit)
Esta história começa no ano de 1996, com a contribuição de uma novela da Rede Globo, intitulada “O Rei do Gado”. Protagonizada por Antônio Fagundes, alcançou elevados índices de audiência, conferindo grande visibilidade a um novo tipo de negócio: os ativos rurais.
Sem sair de casa, sem a necessidade de transitar por estradas de terra, pisar o barro, mexer com adubo ou ração, investidores de todo o país viram-se seduzidos por uma nova modalidade de ganho patrimonial representada pela aquisição de boi ou frango para engorda e abate. As empresas ofereciam ganhos expressivos, muito superiores às aplicações tradicionais em renda fixa, lastreadas no ganho de peso do animal.
O conto prossegue da seguinte forma. Em maio de 1998 foi decretada a falência da Gallus Agropecuária, com passivos da ordem de R$ 35 milhões e cerca de 3 mil investidores lesados. O controlador da empresa seria posteriormente condenado a nada menos que doze anos de prisão.
Diante desta ocorrência, a CVM, Comissão de Valores Mobiliários, que regula o mercado acionário no país, resolveu intervir nos chamados Contratos de Investimento Coletivo (CIC), instrumento jurídico utilizado por estas empresas para promover a captação de recursos. E o maior rigor na fiscalização fez outra vítima. Agosto de 1999 marcou a insolvência da Fazendas Integradas Ouro Branco, baseada no Tocantins, que prometia uma rentabilidade de 12,8% em apenas quatro meses através da venda de leite de vaca.
Mas o golpe fatal no setor deu-se apenas anos depois, mais precisamente em 16 de outubro de 2001, quando a Fazendas Reunidas Boi Gordo entrou com pedido de concordata preventiva (convertido em falência em abril de 2004). Seu proprietário, Paulo Roberto de Andrade, condenado duas vezes por assalto a mão armada e quatro anos cumpridos em reclusão, legou dívidas superiores a R$ 1,2 bilhão. Mais de 20 mil investidores viram suas economias irem literalmente para o brejo – e 89% deles eram pequenos poupadores, com aplicações de até R$ 50 mil.
Pode ser uma expressão do tipo chavão, mas o fato é que nós, brasileiros, realmente temos memória curta. A bola da vez chama-se Avestruz Master, que em sistema similar ao relatado nos casos acima, propagandeia aos incautos rendimentos de até – pasmem – 11% ao mês.
A empresa cresceu com pujança nos últimos cinco anos. Apresenta sete filiais espalhadas pelo Brasil, além do Distrito Federal. E teve sua falência requerida recentemente – e seus sócios, prisão preventiva decretada – após uma sucessão de compromissos não honrados e cheques sem fundos emitidos.
O caso está na fase inicial de apuração. Ainda são se sabe o montante do rombo que será identificado nas contas da companhia e nem o número de contribuintes lesados.
Só sei duas coisas. A primeira, é que nunca comi carne de avestruz, muito embora esta iguaria já devesse fazer parte do cardápio dos restaurantes de todo o país dado o volume de animais criados e supostamente comercializados pela tal Avestruz Master. A segunda, é que muita gente que apostou num negócio arriscado como este vai descobrir que não há mágicas ou milagres no mercado financeiro, pois quanto mais elevada a expectativa de ganho, maior é o risco.
Vão descobrir da pior maneira possível que avestruz voa...
Avestruz voa, por Tom Coelho *
*com formação em Economia pela FEA/USP, Publicidade pela ESPM/SP, especialização em Marketing pela MMS/SP e em Qualidade de Vida no Trabalho pela FIA-FEA/USP, é empresário, consultor, professor universitário, escritor e palestrante. Diretor da Infinity Consulting e Diretor Estadual do NJE/Ciesp .Mais Tom Coelho no www.tomcoelho.com.br.
** conta atendida pela marta lima. com o episódio, descobre-se que uma coisa era verdade: carne de avestruz não engorda.
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