domingo, outubro 23, 2005

desatençao ou malicia a nossa caca da semana

nem tanto pelo conteúdo da carta do mano caetano, devidamente publicada no blog do noblat, transcrita abaixo, nosso fiel mosqueteiro de plantão.
e sim, porque para o público de veja, a revista é irrepreensível,tsc!

motivo de orgulho nacional. quarto título mundial, em tiragem o que, apesar da diferença de números para o terceiro, e considerando-se a relação população do brasil x milhão e alguma coisa, quando tira, revela bem a grande cloaca que é o nosso mercado, cagado por anafalbetimos de toda sorte.

para quem fã de veja, a carta de caetano, é mais um pití de baiana que ora derrama-se no óledo de dendê, ora excede-se afetadamente na pimenta, deslumbrado por sua própria inteligência. para quem fã de caetano, que saudades do caetano ante-lavigne. de quando era cidadão do mundo sem vuitton na bagagem, aposto da rainha midas que transforma em ouro tudo o que toca, até filme nacional, mas que pasteurizou caetano apodrecendo o araçá azul.

não se pode desconsiderar certos pontos “menos midiáticos” sublinhados por caetano, apesar de pessoalmente considerar que winksy musicalmente é cadeira de faculdade e pronto.

no imbróglio imprensa verdade acuidade precisão imparcimônia, não acredito, não só no silêncio e tampouco na ingenuidade dos inocentes. como seus gritos de tortura por denúncias a mentiras e manipulações praticadas ao esturro pela grande, média e pequena imprensa.

por isso mesmo, jornalismo para mim tem a pecha distorcida de romântismo suicida, na busca sifilítica ou de sísifo de trazer à tona a verdade de quem a assina, contraponto as verdades sociais estabelecidas, procurando através dos opostos estabelecer opções de equilíbrio ou de inclinações não acidentais. jornalismo é coisa de unhas e dentes, cérebro e culhão, estômago roncando, indignação rolando, e não esse desfile de griffes em que se tornaram as redações.

vivendo os tempos que vivemos, leitores de qualquer publicação, dotados do privilégio da estaleca disponível para comprar qualquer meio de informação, deveria já ter desenvolvido seus mecanismos de decifração de ideologias falsificadas e sapos defumados que nos tentam enfiar goela a dentro. chama-se a isso cultura e não só de sobrevivência e ou resistência. evoluir o aparato crítico individual ao nível da preservação do rolo compressor da mediocriadade e filhadaputice dominante coletivamente é um desafio que caracteriza uma existência humano e profissional voltada para o alto ou para a fossa.

num mundo, da informação ou não, onde ou se é maria vai com as outras ou se é visto como o pedante do pedaço, com suas variações de enfezadinho da hora ou madre superiora de calcutá, nadar contra a corrente oxigena todos os sentidos. mesmo que depois você afrouxe e rume à cachoeira na banguela.

Desatenção ou malícia
Caetano Veloso

"A matéria de Sérgio Martins sobre Moby da edição de 21 de setembro é o exemplo mais revoltante do que se faz de mau jornalismo em Veja. Além de importar o tom grosseiro dos tablóides de rock ingleses para a grande imprensa brasileira (sim, porque no New York Times ninguém escreve assim), Martins falseia fatos. Moby não pediu perdão a Hugo Chávez. E a frase sobre o Big Bang é minha, não de José Miguel Wisnik. Ela foi distorcida com intenção de ridicularizá-lo.

Expus a idéia no texto do encarte do meu disco A Foreign Sound, que já está à venda há muitos meses em todo o mundo. A conversa que tive com Wisnik a respeito (e que também está relatada no encarte) gerou a nova peça do grupo Corpo, que teve estréia recente com ampla divulgação. O repórter de Veja não tem o direito de ignorar esses fatos. É evidente que ele quis passar por cima dos mesmos com intenção de agredir Wisnik por motivos que ignoro. De qualquer modo, se ele desconhecia manifestações tão largamente publicadas não tinha qualificação para exercer a função que exerce - e se tinha, agiu de má fé. E a editoria geral da revista só pode admitir que algo assim aconteça por desatenção ou malícia. Lendo Veja sobre Moby e Wisnik somos levados a crer que José Dirceu é um homem honesto e sensato."

Veja não publicou a carta acima que lhe enviei. Mas não quero que seu conteúdo fique sendo um segredo entre mim e a redação da revista. Considero Veja uma prova de que a imprensa brasileira tem força e competência. Ao mesmo tempo - e talvez por isso mesmo - é nela que se exibe com mais clareza a relação desequilibrada dessa competência com o todo da nossa realidade. Não falo com Veja desde que ali se publicou uma reportagem intitulada "O Bloco dos Ressentidos", em que aparecíamos juntos Millôr Fernandes, Chico Anísio, Tom Jobim e eu, como brasileiros que se enchem de dinheiro no Brasil e depois falam mal do país. Era uma salada desonesta em que as famosas tiradas de Tom sobre isto aqui ser um país "de cabeça para baixo" (ou sobre nossa dificuldade em lidar com o sucesso) se misturavam à minha campanha pelo respeito aos sinais de trânsito, a frases irreverentes de Millôr, e a piadas de Chico Anísio para provar que esses quatro indivíduos tão diferentes formavam um bloco coeso de desqualificadores da brasilidade.

A matéria abria com montagem fotográfica - que ocupava duas páginas - de nossas caras sobre as figuras da comissão de frente de uma escola de samba. E seguia por várias folhas em que não faltavam as "reações" dos que defenderiam o Brasil contra nós: Gilberto Gil, Marieta Severo, opositores assim.

Evidentemente esses "entrevistados" não tinham idéia do que se preparava na redação. Eu próprio tinha sido abordado por uma moça no camarim do Canecão e, como tivesse sido tão crítico do mal jornalismo quanto do desrespeito às leis de trânsito - e tivesse citado Tutti Vasquez como mau jornalista - vi depois minha crítica ao Vasquez ser tomada como mais um exemplo de sentimento anti-Brasil na reportagem que era assinada por Alfredo Ribeiro - que é o nome verdadeiro de... Tutti Vasquez!

Bem, eu já tinha ficado indignado com Veja desde a morte de Elis, quando a revista, em lugar de fazer um obituário lamentando a perda da grande cantora e louvando seu talento ímpar, deu reportagem de capa, de tom e teor sensacionalista, sobre "a tragédia da cocaína". Antes e depois disso li diversos textos sobre assuntos relativos à minha área de atuação que mesclavam ignorância e má fé em doses altas, sempre com o fito de criar uma cumplicidade esnobe com o leitor. A aura de respeitabilidade de que a revista se revestia não correspondia a essas investidas irresponsáveis e arrogantes. Com a matéria dos "ressentidos", rompi relações. Ou seja: Veja passou a ser apenas uma casual leitura de trecho de antigo artigo em sala de espera de psicanalista. Mas nunca considerei isso um bom sinal.

Vários colegas meus sentem grande nojo da revista e, embora saiba que eles em geral têm razão, eu preferiria que não fosse assim. Um órgão de imprensa pode e até deve orgulhar-se de ser presença incômoda na vida dos célebres e dos poderosos. E de meter medo em grupos que tendem ao corporativismo. Isso faz parte da saúde social de uma democracia. Assim, nunca foi sem pesar que me vi repetidas vezes reafirmando minha rejeição ao diálogo com Veja. Lembro-me de sua aparição. Coincidiu com a do tropicalismo (este explodiu em 1967 mas só ganhou o nome em 68, ano em que Veja foi lançada) e, embora eu nunca tivesse sido muito fã do estilo Time de publicação (e a despeito de eu quase não ler jornais naquela época), senti ali algo semelhante ao que senti com a modernização da TV Globo: estamos crescendo, nos profissionalizando, nos desprovincianizando, independentemente dos aleijões que criemos no âmbito da organização política. Em plena ditadura, eu sentia isso com clareza, mesmo quando preso ou exilado pela ditadura. Sempre achei mesquinho julgar quão bem (ou mal) estamos pelo grau de identificação entre nossos mitos políticos e os poderes constituídos que nos representam.

Assim, nunca julguei a Globo por ser simpática aos militares (quão simpática a eles era ela mesmo?); sofri com o expurgo inicial de Dercy e de Chacrinha (este voltou à emissora com glória), mas vibrei com a conquista de padrão de qualidade.

A Veja era algo dessa natureza. E ela influenciou a imprensa brasileira como um todo. Lembro de ler, talvez nos anos 80, entrevista de Otávio Frias Filho reconhecendo que Veja era o exemplo que ele gostaria de seguir. A Folha iniciava sua brilhante fase de sofisticação, com Matinas Suzuki tocando a Ilustrada. No tempo do tropicalismo eu vivia em São Paulo. E nem tinha paciência de me demorar no Rio de Janeiro quando o visitava.

Há algo em São Paulo que aprendi então e que sinto como essencial até hoje. A Folha, a Veja, a USP, a poesia concreta, a música nova, o PT, o PSDB, tudo isso participa dessa qualidade difícil de definir. Mas uma das características que ressaltam preciso nomear agora: a inclinação natural para pôr o que produzimos em perspectiva internacional. Claro que a bossa nova foi inventada por um baiano e centrou-se no Rio. E que o Cinem Novo foi liderado, no Rio, por um outro baiano, que julgou poder prescindir de São Paulo. E ambos os movimentos tinham em mente (e conseguiram em grande parte) realizar discos e filmes que se pusessem em perspectiva internacional.

Mas (embora Gláuber fosse discordar, João Gilberto afina) o filtro carioca foi sempre a afirmação de uma capital de colônia sobre o provincianismo interno. São Paulo é ainda uma província interna, mas com sua pujança, termina por fazer ligações diretas com o grande mundo sem passar pelo filtro do Rio.

Assim, a Ilustrada e Veja podem ter criado Ipanemas de laboratório dentro das redações, mas deram uma trombada na perspectiva viciada que nos sufocava. Por isso que as mais bem-sucedidas contrafações de Paulo Francis são paulistas. E elas não são nenhum Paulo Francis: são o aspecto ipanêmico dessa movimentação curiosa.

Por outro lado, com minhas crescentes convicções de que há algo mais progressista na herança liberal do que nos sonhos de ditadura do proletariado, vejo minha discrepância com Veja com tristeza - e o mau jornalismo que se incentiva ali (aquilo não pode ser apenas admitido) com impaciência. É que entender tudo isso (e mesmo divertir-se com isso) não significa aceitar descalabros como um crítico de música abrir uma página sobre Moby e, nela, além dar receitas de como os músicos pop devem exercer sua rebeldia, enxertar agressão a José Miguel Wisnik, que nada tinha a ver com a história, usando, para isso, referência a idéia sabidamente minha e não dele.

A restrição feita a Moby era por ele ter pedido desculpas pelo fato de seu país (os Estados Unidos) ter o presidente que tem. Utilizando o carimbo "Hugo Chávez" para defender Bush contra Moby, o crítico, sob o grosseiro título "Cala a boca e toca", achincalha Wisnik já na manchete, dizendo que ele é mais chato do que Moby, pois, como depois se explica no corpo da matéria, teria considerado o termo Big Bang como uma apropriação da origem do universo pela cultura anglo-saxã.

Lembrei-me de que li em Veja, quando a invasão do Afeganistão era iminente, palavras grosseiras assim: "um bando de pé-rapados maltrapilhos não pode enfrentar o maior exército do mundo" (cito tudo de memória, não guardo Vejas em casa). Coisas como esse comentário e aquela matéria fazem a gente perceber que a editoria finge que Mainardi é o Agamenon mas sabe que sua coluna é mais séria do que essas reportagens e resenhas. Afinal, a glória de Mainardi contra Lula é merecida, a de Sérgio Martins (o autor da matéria sobre Moby) contra Wisnik, não. Mainardi, com seu cinismo que só serve para desembaraçar a cabeça de quaisquer preocupações (ou inspirações) maiores, terminou citando sempre dados majoritariamente comprováveis; Martins não verifica suas informações, nem presta contas a ninguém de seus abusos.

Qual a razão de tais distorções? José Miguel Wisnik não é um campeão de vendas de CD, não lota casas de show, não tem seus livros na lista dos mais vendidos - por que diabos seu nome vai parar numa manchete de Veja? Dir-se-ia que a piada poética que eu escrevi no encarte do CD "A Foreign Sound" (que não apenas os seres das mais distantes galáxias falam inglês nos filmes como o próprio universo começou com uma expressão - como frisou seu inventor - bem inglesa: Big Bang) é um escândalo intelectual e político de tal monta que não poderia deixar de ser comentado com derrisão.

(Fiquei sabendo depois que a frase, já atribuída a Wisnik, tinha aparecido semanas antes, a título de achincalhe, na seção de "frases" da revista.) Mas se era algo assim tão momentoso, por que, em tanto tempo, e com tanto material à mão, os valentes repórteres-críticos de Veja não foram checar como, por quê, por quem, quando, onde aquilo tinha sido concebido? Sim, porque não apenas escrevi isso no encarte do meu disco como desenvolvi com Wisnik todo um balé para o grupo Corpo em torno desse mote (essa é a vinculação de Wisnik com a "frase").

O balé estreou em São Paulo com farta cobertura da imprensa. Estréia em Nova Iorque na semana que vem. Como Martins não sabia de nada disso? E por que mirar no Zé Miguel? Quer brigar comigo, fala direto comigo. Querem o quê? Controlar o núcleo uspiano a que se agarram e de que Zé Miguel parece ser a ovelha negra que gosta demais de Caetano Veloso? Qual a ligação entre esse absurdo jornalístico com o absurdo intelectual de a resenha do livro de Wisnik (em destaque o belo ensaio sobre Machado de Assis e a música popular) ter sido uma galhofa que tentava reduzir o autor a um deslumbrado admirador de Chico e Caetano?

Eu não preciso de grandes provas de que a música popular pode ser algo desimportante. Mas que imbecis como Sérgio Martins sejam convocados para agredir pensadores finos como José Miguel Wisnik por causa dela é, para minha mente incrédula, quase uma prova definitiva de sua importância suprema.
Caso o meu leitor não lembre mais, carta que mandei para Veja e Veja não publicou é a seguinte:

A matéria de Sérgio Martins sobre Moby da edição de 21 de setembro é o exemplo mais revoltante do que se faz de mau jornalismo em Veja. Além de importar o tom grosseiro dos
tablóides de rock ingleses para a grande imprensa brasileira (sim, porque no New York Times ninguém escreve assim),Martins falseia fatos. Moby não pediu perdão a Hugo Chávez. E a frase sobre o Big Bang é minha, não de José Miguel Wisnik. Ela foi distorcida com intenção de ridicularizá-lo.

Expus a idéia no texto do encarte do meu disco A Foreign Sound, que já está à venda há muitos meses em todo o mundo. A conversa que tive com Wisnik a respeito (e que também está relatada no encarte) gerou a nova peça do grupo Corpo, que teve estréia recente com ampla divulgação. O repórter de Veja não tem o direito de ignorar esses fatos. É evidente que ele quis passar por cima dos mesmos com intenção de agredir Wisnik por motivos que ignoro. De qualquer modo, se ele desconhecia manifestações tão largamente publicadas não tinha qualificação para exercer a função que exerce - e se tinha, agiu de má fé. E a editoria geral da revista só pode admitir que algo assim aconteça por desatenção ou malícia. Lendo Veja sobre Moby e Wisnik somos levados a crer que José Dirceu é um homem honesto e sensato.

Caetano Veloso.

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