quarta-feira, janeiro 25, 2006

dichionário

estou na cave dos meus pensamentos roendo uma laranja.

cave é quase porão para brasileiros. porão que no brasil nem sempre fica abaixo do terréo, que em portugal é rés-do-chão. o porão pode estar no alto, principalmente nas casas que o disfarçam como sotão.

sotãos, onde antes só habitado por fantasmas, tal como águas furtadas, habitadas hoje por quem ganha fantasma de salário ou busca moradia com aplomb - o dichionário é de português, portanto…
bem apropriadas para salário de publicitário que anda a baloiçar por excesso de bolso para tão pouca nota. nota no brasil é grana, grana é estaleca em portugal, o mesmo que bufunfa pra brasucas. tanto lá como cá é preciso uma nota preta, bufunfa, estaleca, money, para se morar realmente bem, por mais criativo que se seja.

pequenos cômodos acima do ultimo dos últimos andares, que é como se chama apartamentos em terras portuguêsas, o nosso equivalente para as águas furtadas antigamente eram moradia dos porteiros e ou zeladores que também, como em portugal, algumas edificações a tem no rés-do-chão que você já sabe o que é. há um nome peculiar em portugal, para quem, cada vez mais raro, faz as faxinas, as zeladorias para os prédios, verbete que vou ficar devendo até a próxima. antes diminutas e desprezíveis. hoje, a parte mais cara de um andar no brasil, as ditas coberturas, onde até pode-se jogar tenis e nadar até cansar. em portugal, cidade milenar as coberturas ainda não se multiplicaram talvez porque mesmo para os mais abastados anda difícil multiplicar o dito cujo, pelo menos honestamente. se é que alguma multiplicação, incluindo a dos pães, seja honesta. cabe-me o pesar de informar-lhes que lá e cá a classe media ou mírdia, com dizemos, está morta e nem sequer soube como seria enterrada.

mas não quedem-se sôfregos porque estou a roer uma laranja. continuo a roer as unhas quando de vez em quando a ansiedade beija-me a boca à força. roer uma laranja é chupar uma laranja. mas cuidado, não se arme, armar é tomar ares do que você não é, como muita gente que se acha grand-prix, em desabrido cuspidor de piropos, que laranja tem caroço. um piropo são gracejolas, as nossas cantadas. e dizer a uma rapariga, por mais que ela o seja, no sentido brasileiro, que apetece-te roer-lhe a pachacha ou sera paxaxa? que no português de portugal equivale a nossa xereca, xoxota, buceta, xana, que é diferente de chanha, um coceira que orgasmo não cura.
ainda que necessite de alguma outra vitamina que não seja a C vão, no mínimo, aconselhar-te a tomar um sumo da fruta, que é como se chama suco, considerando-te de péssimo mau-gôsto, de tal azedo equivalente ao que entendemos como sumo, que é o que sai da casca esperemida que amarga a boca e avermelha os olhos pra além do queimor.

no geral, todo a gente, que é como se diz todo mundo, vai achar no mínimo brejeiro, palavra com que os portugueses ainda classificam certos calões. calão, coisa que nossos avós, alguns portugueses, não por mera consanguinedade, vociferavam com rigor. maior ainda quando nos admoestavam nossos pais para não perderem a compostura e não usar palavras de baixo calão. o que hoje está imiscuído em nossos vocabulários abertamente como gíria que é como chamamos calão, pesada ou não.em portugal só com a malta jovem portuguêsa, malta traduza por galera, “tchurma”, o faz, e com algumas reservas.

apetece-me dizer-vos por fim que, em portugal, quando se diz que alguma coisa nos apetece, é que a vontade prazeirosa de fazê-la está mesmo na ponta da lingua, tamanho desejo de .e, dito à portuguêsa, é sentir quase um tesão, palavra que os portugueses ainda classificam também de calão ou igualmente brejeira.

se uma coisa brejeira no brasil é ainda remanescente e típica das populações do campo, com seu eterno olhar de inocência sobre o novelo do mundo, sem nenhuma maldade, mas de perspicácia de nos dar nó, em portugal a coisa pega. brejeiro tem um sentido de libertinagem que não vai bem na programação familiar.

o dichionário hoje, por exemplo, andou pra lá de brejeiro.

p.s. madeira de dar em doido, é madeira ou galho de grande resistência que não quebra quando está quebrando as costelas ou a cabeça dos outros(post do cavaco) e sobrar, tanto é o excesso pelo lado positivo, ganhar com muita vantagem; sobrou futebol, jogar muito ou sobrar como sentido de dançar que neste caso é se dar mal. o carro sobrou numa curva ou seja: derrapou e lá se foi para fora da estrada. assim se sobrou cavaco não faltou louçã, este sobrou mesmo pior ainda que o saarsfield

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