1. Fiquei pasmo.
Tinha assumido a diretoria de operações da agência e procurava conhecê-la por dentro, quando me deparei com aqueles anúncios. Foram feitos para um grande jornal. Se você já trabalhou com esse tipo de cliente, sabe que suas campanhas são um misto de institucional, promocional e de varejo.
Eram dezenas de peças que nada tinham em comum. Preocupado, pedi uma reunião com o diretor de criação e sócio da agência. Espalhei os anúncios na sala e procurei mostrar que não se podia dizer que havia, ali, uma campanha, pois cada um chutava para um lado. Faltava integração, e em conseqüência, sinergia.
O diretor de criação daquela que, a bem da verdade, era (aliás, ainda é) considerada uma das agências mais criativas do país, disse-me não saberia passar para a equipe o que eu estava falando. Pediu-me que me dirigisse diretamente a ela. Passou a mão no telefone, e convocou os criativos – sete ou oito duplas, ao todo.
O pessoal apareceu, falei, falei, falei, não adiantou nada. Ouviram-me em silencio, voltou para suas salas, onde provavelmente me chamaram de louco e tudo continuou do mesmo jeito.
Esse fato, é bom lembrar, ocorreu na década de oitenta, em S. Paulo.
2. Vinte anos depois, se levarmos a sério as matérias que vêem sendo produzidas por quem esteve agora em Cannes, temos de concluir que dois assuntos traumatizaram os publicitários brasileiros ali reunidos: a necessidade de as agências se reinventarem e a importância de se adotar a comunicação integrada de marketing.
Isso mesmo: essa coisa sobre a qual todo mundo fala, mas a maioria não tem a menor idéia do que significa.
3. Veja algumas afirmações que a imprensa sublinhou:
“Estão acontecendo três grandes alterações: 1ª.) uma nova geografia em que cada vez mais o Ocidente se vê ameaçado pelas potências asiáticas como a China, e isto tem um profundo impacto nos negócios; (2ª.) as agências não podem mais ser chamadas de agências de propaganda – pelo menos no grupo WPP elas já são non advertising ou marketing services agiencies; (3ª.) ninguém que trabalhe com comunicação pode viver sem mensurar – de dados de pesquisa a resultados de campanha”. (Martin Sorrell)
“Estamos no negócio de gerar idéias que vão atrair a atenção dos consumidores, independente de qual seja a mídia. Para atender a demanda dos clientes, criei uma agência que entende que vivemos num mundo multimídia e multitarefas. Por isso, treinei meus criativos a pensarem em comunicação de forma diferente. Em lugar de responderem por disciplinas, são os responsáveis pela criação de conteúdo de marca. Se o conteúdo é bom, ele se aplica a qualquer meio”. (Chuck Porter)
“Sinto falta da mídia trabalhando mais perto da criação”. Howard Draft)
“Os cases apresentados nas palestras de ontem, que integram publicidade tradicional, relações públicas, ações na Internet e marketing viral, são simplesmente fantásticos... O maior empecilho para a multiplicação de bons cases nacionais de comunicação integrada é o modelo que sustenta o nosso mercado publicitário. A combinação de agências ambiciosas, veículos poderosos e anunciantes cautelosos retarda qualquer processo de inovação neste setor. Resta saber, afinal, até quando”. (de um jornalista deslumbrado com o que viu e ouviu em Cannes)
Você há de concordar comigo que não há nenhuma novidade nisso. Principalmente depois de ler o fato que contei no início deste papo.
4. E agora?
Lamento ter de informar que agora pegou no breu: o processo é irreversível. Ou agências e publicitários brasileiros embarcam nessa canoa ou vão se afogar na maré da inovação.
Para quem duvida disso, transcrevo trecho de um texto em que Walter Bender, diretor-executivo do MidiaLab do Mit faz o prefácio do livro Estratégia para a Mídia Digital, de Beth Saad (editora Senac S.Paulo):
“... o professor do Massachussets Institute of Tecnology (MIT), Mitchell Resnick, afirmou que há duas revoluções em andamento. Para ele, a primeira revolução é a da tecnologia; a segunda é a do aprendizado. Resnick ainda afirma que se as considerarmos simultaneamente, torna-se claro que há uma terceira revolução, a da expressão pessoal e interpessoal”.
Para quem continua duvidando, um aviso: aproveite bem o dinheiro que está ganhando, mas se prepare para fechar sua agência, se for empresário; ou para ser expulso desta profissão, se se considera profissional.
eloy simões, dando uma força mesmo quando não sabe.
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