quarta-feira, julho 27, 2005

quarta à portuguesa: para os criativosos de sempre. ontem e hoje.

Na publicidade, quando alguém quer copiar alguma coisa, mas pretende emprestar um pouquinho de dignidade a esse gesto, diz que está seguindo uma tendência. Isso faz com que publicidade de boa qualidade acabe gerando sem querer publicidade de péssima qualidade.

Alguns exemplos: os outdoors com apliques. Participei da criação do primeiro deles, anos atrás, na DPZ. Francesc Petit e eu estávamos lançando o produto Chancy da Chambourcy. Criamos um comercial que mostrava um menino andando pelas ruas. De repente, ele via um outdoor com um pote de Chancy delicioso. Subia no outdoor, pegava a colherona que estava dentro do pote e comia o produto. Nada mais natural que, depois de o filme já conhecido, fizéssemos um outdoor com o garoto montado lá em cima. A peça foi um grande sucesso. Tão grande que de lá para cá surgiram milhares de outdoors (pouquíssimos bons) com apliques. Vira e mexe, falta uma boa idéia para um outdoor e alguém coloca um aplique. Na verdade, um aplique no cliente. São aqueles outdoors onde fica claro que o marceneiro é melhor que o redator e o diretor de arte.

Outro exemplo: os fundos de anúncio com cores berrantes que o Marcello Serpa andou usando com extrema pertinência e que de repente começaram a surgir numa porção de anúncios sem razão nenhuma, no máximo, conseguindo atrapalhar a mensagem ou disfarçar a falta dela.

O mesmo, aliás, ocorreu com algumas tipografias diferenciadas que o Jarbas Agnelli inventou de usar em layouts perfeitos como os de Hyundai ou da campanha Sede é Soda e que agora já enfeitam ou decoram uma série de anúncios que não têm a mínima razão para receber aquela tipografia.

Outra aberração que tem ocorrido com freqüência são as campanhas que, ao invés de venderem o produto, vendem a categoria do produto. São campanhas onde se vende andar de carro ao invés da marca do carro que está pagando o anúncio, beber água ao invés do engarrafador daquela água, e assim por diante. Fazer propaganda assim é fácil e pode até ser adequado em países que estão no seu primeiro estágio de consumo, onde a primeira função da propaganda é comunicar que aquela categoria de produto agora existe.
Não é o caso do Brasil, um país que, apesar dos seus inúmeros problemas de distribuição de renda, conta com um marketing extremamente sofisticado e uma competição bastante acirrada entre marcas há muitos e muitos anos.

Enfim, são inúmeros os casos onde se confunde publicidade criativosa com criativa, mas mais importante do que ficar denunciando o fato de essas aberrações existirem é tentar descobrir porque elas existem. Talvez uma explicação seja o fato de muitos publicitários consumirem como informação mais publicidade do que vida real e a partir daí começarem a colocar publicidade ao invés de vida nos seus trabalhos. Talvez o fato também de os publicitários conviverem exageradamente com outros publicitários, o que explica inclusive o grande número de campanhas que falam sobre a própria propaganda, desconhecendo frontalmente o consumidor. Por isso, defendo loucamente que qualquer campanha publicitária tem a obrigação de falar a linguagem do produto, do público e do país onde ela está sendo veiculada. Por isso, luto para que os festivais tenham apenas peças que foram veiculadas e chego até a enxergar como mérito quando uma peça que foi brilhante junto ao consumidor do seu país não é premiada por falta de entendimento do contexto por parte dos jurados internacionais. A praga da publicidade fantasma, criada apenas para festivais, tem atrapalhado o desenvolvimento da publicidade de verdade em todo o mundo e ajudado a implantar picaretagens apelidadas de tendências.

Outro dia mesmo fui visitado por um simpático e talentoso representante da propaganda sueca que estava de passagem pelo Brasil. Ele me mostrou um rolo de comerciais que deixava claro que a publicidade nórdica está progredindo muito, mas, no meio deles, um comercial me causou estranheza. Trata-se de um filme onde um sueco acorda de porre, pega uma guitarra e começa a compor um blues desesperado, como é bastante comum na cultura e nos comerciais ingleses. Como nós sabemos, suecos fazem muitas coisas, mas não compõem blues pelas manhãs. Na verdade, a minha estranheza tinha uma explicação. O comercial era literalmente para inglês ver. Em festivais.

criativo versus criativoso. texto do washington olivetto escrito em - 03/04/95

Um comentário:

celso muniz disse...

alguém já disse que as tendências para além de ser uma praga são muito difíceis de serem realmente detectadas. são como as ondas. vc sabe que elas vem mas poucos sabem quando, como e aonde. e tome surf, ou melhor vaca(queda braba da prancha). além disso, analogizando, resto de vaca hoje, nem bosta, já que as vísceras são o filet mignon da rações.