Até que ponto a crise da propaganda brasileira se deve à revolução tecnológica que detonou e fragmentou a mídia em tantos pedaços que não dá mais para se ter uma visão do conjunto? Tenho minhas dúvidas.
Acho que muita coisa mudou, sim. Muitas para pior. Por exemplo, será que ninguém percebe - em nível global - quanto dinheiro as empresas multinacionais estão jogando fora, por causa da discutível noção de que é mais barato criar e produzir uma só campanha, em Peoria, Illinois - ou em Londres ou Paris - e tentar traduzi-la e veiculá-la pelo mundo a fora? Grandes e belos anunciantes - como a Shell, a IBM ou o Citibank - que se destacaram por campanhas que se tornaram referência na propaganda brasileira, hoje veiculam, na TV, filmes dublados, incompreensíveis e irreconhecíveis, que certamente nada vendem nem contribuem para a imagem institucional que construíram no Brasil durante mais de meio século. Empresas tradicionais, no Brasil, como a Nestlé (suíça) e a Philips (holandesa) chegaram ao cúmulo de usar, na sua comunicação, slogans em inglês - Good Food Good Life e Sense and simplicity. Abriram mão de serem meramente entendidos pelos 90% da nossa população que é monoglota.
Mas os estrangeiros - e o tolo "alinhamento" de agências, que asfixia as agências locais - não são os únicos culpados. Por necessidade de trabalho, assisto a muita TV - que ainda é a mídia líder para se falar com o consumidor brasileiro e morro de saudades dos comerciais das Almap, DPZ, Artplan, das agências baianas, e até da Standard, dos anos 70 e 80. Parece-me que metade de todos os comerciais produzidos para qualquer produto ou serviço, atualmente, no Brasil, recorrem a uma criança supostamente engraçadinha (mas, de fato, "ardida") para vender automóveis, iogurte, telefonia, convenções em Recife, livros, medicamentos, roupa - tudo. A outra metade parece ser de comerciais de varejão tipo hard sell. E muitos agridem o consumidor, como os balbucios para Pepsi e para Brahma; o pai com nariz de palhaço, atacado pela família; o gago retardado da Intelig... uma tristeza. Não veremos, de novo, tão cedo, um orelhão assassinado ou um primeiro sutiã. Acho que nem mesmo outra série dos Mamíferos. Chegamos à Terra Indesejada.
E não é só a TV. O rádio insiste em veicular trilhas da TV, que ninguém entende - para o cliente não gastar 2 tostões a mais e a agência ter menos trabalho. Muitos planos de mídia parecem feitos por maníacos compulsivos. A maioria dos sites da internet parece ser o resultado de uma conspiração entre o diretor financeiro, a pessoa de RH e o chefe da manutenção elétrica. Nenhuma sensibilidade para as emoções do consumidor, nenhum marketing, nenhuma propaganda - daquela, antiga e boa, que levava em consideração que - dos dois lados do processo comunicante - havia gente, pessoas, seres humanos que nada mudaram em 600 séculos de civilização.
Envolvi-me pessoalmente na elaboração desta edição durante cerca de 3 meses - e cheguei ao seu fechamento com uma certeza, adquirida nesses 3 meses e outros 50 anos ou mais: de que, no mundo da nova propaganda, haverá ainda muito espaço para talento, dedicação, esforço, seriedade e conhecimento.
A nova propaganda é muito ruim, do J. Roberto Whitaker Penteado, Publicado na Revista da ESPM de setembro-outubro 2006: Tema "A Nova Propaganda"
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