Uma das grandes discussões nos dias de hoje entre anunciantes, agências de publicidade e de marketing é quanto à comunicação integrada. Sabe-se que a publicidade não dá mais conta de vender produtos e criar relacionamento com os consumidores sozinha. Promoção, eventos, merchandising no ponto de venda e um sem-número de serviços entram para a lista da famosa comunicação 360º que parece ter surgido ontem. A história, porém, mostra que não é bem assim.
Em 1985, o publicitário, empresário e presidente da Artplan, Roberto Medina, criou o Rock in Rio como uma plataforma de emoções que conjuga uma relação de proximidade das pessoas com as marcas que tiveram atreladas às três edições realizadas no Rio de Janeiro. Depois de 2001, ano de realização do último evento, o maior festival de música do mundo foi para Lisboa em 2004.
O início do trabalho acompanhando o pai, o ícone Abraham Medina, pelas ruas da Cidade Maravilhosa enfeitando as árvores com bolas para o Natal; o começo na agência de publicidade Midas - do grupo de empresas do patriarca; a entrada na Artplan; as inovações e transformações que provocou na comunicação e no marketing; o Rock in Rio; a tensão do seqüestro em 1990; o maior show de Frank Sinatra no mundo.
Na entrevista a seguir, Medina fala sobre comunicação integrada e do posicionamento que os profissionais de marketing e publicidade devem tomar para criar algo como o Rock in Rio ou como a Árvore de Natal da Bradesco Seguros, montada há 10 anos na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio, e terceiro maior evento da cidade, atrás do Carnaval e o Reveillon.
Você pensava em ser poeta, não foi? O que esse lado literário lhe ajudou na publicidade, no marketing e no mundo dos negócios?
Se não tivesse um pai empreendedor, realmente eu seria escritor, poeta. Mas, com a trajetória de realizações e a cobrança dele para dar continuidade aos negócios, tive que encontrar alguma coisa que coubesse um pouco da redação, do sonho e a propaganda caiu na minha vida assim. Quando comecei na Midas Propaganda, participei de uma concorrência com 25 agências. Fiz uma campanha sem dinheiro, uma coisa que não sabia que era ridícula do ponto de vista de apresentação, mas a idéia era muito boa. Aí o diretor de marketing me chamou e mostrou a campanha do concorrente para eu ver o que era uma campanha. A minha campanha era uma vergonha, mas o diretor disse que gostou muito da minha idéia e me deu 15 dias para apresentar uma outra campanha. Depois, ganhei a conta com 17 anos. Na época era o açúcar Cristal, como se fosse o açúcar União hoje. Aquilo me animou e achei que poderia ir adiante.
Mais tarde, na Artplan, ficou muito nítido que os vários aspectos da comunicação eram importantes para incorporar a propaganda. Se você pegar um relatório meu de 1972, eu dizia que não era propaganda, era comunicação, que a gente tinha que saber e olhar o todo.
Hoje, para você elaborar uma idéia de uma árvore que flutua e acende, você tem que saber quanto custa e a probabilidade de aquilo acontecer, mas não tem publicitário que saiba fazer isso. Então, esta história de comunicação total é conversa para boi dormir. A maioria das pessoas não pensam, não sonham, não tem alma disso (da comunicação integrada). Como nasci numa casa que era um backstage de shows todo dia, sempre entendi a propaganda com uma das ferramentas da comunicação integrada. A formação acadêmica do publicitário, no mundo, é a mesma de 50 anos atrás.
Ainda hoje você faz atendimento?
Não no dia-a-dia. Hoje me dou ao luxo de fazer as coisas que gosto. Fui nesta reunião para defender a campanha que gostava muito, a do “Mudei de Shopping”, do Rio Design. Fui para falar do negócio, do negócio no futuro. O cliente está querendo esta discussão com as agências, pois vivemos nos mesmos parâmetros há 100 anos.
Tem muita gente achando que pode fazer a diferença com um comercial de 30 segundos. E onde fica o profissional de propaganda e marketing com o TiVo e com a Internet? As pessoas não entendem nada de promoção, de eventos, de ponto de venda. Vai haver uma mudança tão profunda nos próximos 10 anos que vai ser curioso de ver.
Hoje todos querem uma postura diferente. Mas lá atrás, quando o seu pai queria colorir as geladeiras brancas, a indústria disse não e depois ele provou o sucesso da estratégia. Será que os profissionais de marketing estão mudando?
Eles sabem que estão patinando na mesmice. Mas eles não têm o comando da operação e, para proteger os seus empregos, não ousam em coisa nenhuma. Ninguém quer ousar. A intuição deixou de ter lugar para a lógica. Mas a lógica não gera grandes paixões. Tem coisas que você não substituiu e o Rock in Rio é um exemplo disso.
No primeiro Rock in Rio a propaganda formal foi 20% e 80% era assessoria de imprensa. E não tinha planejamento naquela época. Era a intuição de que poderia ser feito. É preciso gerar uma relação com a marca. Esse caminho é inevitável. Não é colocar o selinho em um evento. Vamos dizer que o Sting viesse aqui para ajudar causas sociais, que isso fosse integrado na campanha, que virasse notícia e aí a marca entra nisso. Faz sentido quando é um projeto de comunicação, que por acaso tem um show, como é o caso do Tim Festival e do Skol Beats que são belos projetos. Essa coisa de eventos vai gerar uma bolha e depois vai se acomodar como uma experiência de marca, e não como patrocínio.
Isso, mais de 20 anos depois do primeiro Rock in Rio, que deu início a isto tudo.
O Rock in Rio é uma das maiores experiência do mundo. É uma experiência de uma Copa do Mundo, de uma Olimpíada, só que na música. E, se o mundo continuar conspirando a favor vai ser uma coisa, pois o Rock in Rio vai agora para a Espanha, depois vai para a Grécia, para a China e volta para o Brasil. E isso eu nunca contei para ninguém porque falo somente o que sinto. É obvio que isso vai acontecer. Primeiro na Grécia que está me procurando muito, depois na China porque é um mercado desafiador e depois volta para cá. E aí você terá uma marca mundial, feita como uma grande aventura, uma intuição.
É, sempre, o seu sonho que vira realidade.
Não tinha muita lógica. Nunca tinha vindo artista nenhum aqui. Aí você traz o artista. Aí não tinha dinheiro para contratar, o mercado não tinha dinheiro para pagar. Mas a gente foi lá e fez: primeiro com a Brahma, depois com a Coca-Cola e depois com a América On-line. Então como é que é isso? Por isso que digo que os diretores de marketing são covardes porque eles precisam da lógica para aprovarem o seu badget e para não perderem o emprego que tem. Óbvio que tem importantes e honrosas exceções, mas a maioria é covarde.
Eles têm que sonhar. Não é rasgar dinheiro. É ser parceiro de sonho. É se cobrir de pesquisas e de todo acontecimento em volta para que o índice de erro seja o menor possível. O que está aí é de uma extrema bobagem.
O que falta para os profissionais de marketing e de publicidade sonharem, pegarem um guardanapo e desenhar uma árvore de natal que flutue em plena Lagoa?
Falta as agências e os diretores de marketing se darem liberdade e deixarem de lado o trabalho mecânico. Sou do tempo em que, ao tomar um chopp com o diretor de marketing, saía-se com uma grande idéia, um projeto, um sonho que se tornava realidade. A gente fazia pesquisa, os comerciais eram de 30 segundos, os veículos eram os mesmos de hoje e construíamos, a partir da intuição, de um sonho, um projeto. Mas não é intuir do nada.
Quando se intuiu é porque você tem uma noção do todo. Não consigo pensar num produto sem pensar no que está acontecendo na concorrência, quem é o consumidor, que negócio posso desenvolver e como posso crescer. O meu negócio é pensar como uma engenhoca vai mudar o padrão. Nunca fiz uma campanha sem andar pela rua e falar com as pessoas. Deveria ter um tempero entre a paixão de Cannes e a paixão pelo negócio do cliente. As duas coisas balanceadas dão resultado.
Muita coisa continua a mesma, mas o consumidor mudou muito.
Ele está muito mais exigente e muito mais prático. O problema é que complicamos muito a nossa profissão mais do que ela é. Nós somos vendedores e o camelô ainda é melhor porque quando chove aparece o guarda-chuva na hora...
E é o mesmo cara que vende água quando faz sol.
Esse cara é genial. E ele faz de tudo para vender: jingle, promoção... Ele é o bellow the line! E agente fica fazendo uma maquiagem para vender.
E você, o que vai vender agora, qual é o próximo sonho?
Quero ampliar a agência em São Paulo, fazer um novo conceito de agência - na verdade um grupo com a Dream Factory e aprofundar nas idéias. De Rock in Rio, se formos bem sucedidos na Espanha (em 2008, em em Portugal com a segunda edição em Lisboa também em 2008), e tudo conspira para isso, depois vem Grécia, China e Brasil em 2014. Vou fazer no ano da Copa do Mundo. Porque a Copa vai ser aqui, a menos que o Brasil recuse. É uma oportunidade do Rock in Rio voltar ao Brasil. Já estou desenhando este projeto.
Como vai ser?
Não posso dizer. Estou desenhando, mas não posso falar. As pessoas reclamam que faço o Rock in Rio fora. Toda hora me perguntam quando será o próximo. As pessoas querem uma festa. Para ter 1,5 milhões de pessoas num lugar tem que ser uma festa. E isso nasceu a partir de uma idéia, de um sonho. Convivi com os grandes profissionais de propaganda deste país e nunca vi o planejamento criar normas para eles. Vi eles criarem grandes idéias e o planejamento justificar as idéias deles.
(entrevista realizada pelo bruno mello e publicada no www.mundodomarketing.com.br, reproduzida aqui com pequenos cortes que não alteram nem modificam o pensamento original)
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