terça-feira, janeiro 02, 2007

mr.wilda: um dos primeiros e até hoje um senhor diretor de arte

Profissional que é o verdadeiro portfólio da nossa propaganda. Um homem que trabalhou nessa profissão quando ela ainda usava fraldas no país, um dos primeiros layoutmen (hoje chamados de diretores de arte) do país.
Nascido em Hamburgo, na Alemanha, em 1915, Mr. Gerhard Wild, faz parte da história da propaganda brasileira, tendo trabalhado com os mais importantes profissionais e clientes que nós podemos imaginar. Ele viveu a publicidade antes mesmo de ela receber toda essa brilhantina. Wilda fez o lançamento do televisor no Brasil, criou o primeiro logotipo da Kibon e famosas campanhas para Mobil e os automóveis Cadilac. Foi também um dos fundadores da Escola Superior de Propaganda e Marketing e participou de muitos júris e festivais.Ele brinca, antes de começar a entrevista, dizendo: "meus alunos saiam das aulas sabendo falar outra língua, o português com sotaque de Hamburgo".

E.H. - Como o senhor começou na propaganda?
Wida - Foi meio por acaso. Na verdade, eu queria ser engenheiro de aviação. Mas o destino me levou a estagiar em uma grande agência alemã onde meu tio era diretor de uma das filiais (na Alemanha os estágios eram bem renumerados e duravam até 3 anos), a Rudolf Mosse. Nesta agência estagiei em todos os departamentos menos - por incrível que pareça - na criação. É que em 1931 a criação era feita fora, por artistas gráficos. Hoje, considerados os fundadores da comunicação visual na Alemanha.

E.H. - O que fez o senhor deixar a Alemanha?
Wilda - Em 1936, o ambiente político em meu país estava nebuloso e pressentia-se uma perseguição aos judeus, que virou realidade com o início da guerra. Fui para a Inglaterra e consegui emprego na British-Continental Press Ltd., uma agência especializada em propaganda têxtil. A Europa prestes a entrar em convulsão e diversos amigos judeus-alemães vivendo no Brasil foram fatores decisivos para que eu embarcasse em um navio cheio de sonhos com destino ao Brasil, no mesmo ano de 1936.

E.H. - Como foi sua entrada no mercado brasileiro de propaganda?
Wilda - A propaganda no Brasil ainda engatinhava. Eu fiz parte de uma geração que desbravou esse mundo com poucas referências. Talvez, o que de melhor tínhamos para nos guiar era a já deslumbrante propaganda americana. A grande escola. Minha primeira agência aqui foi a N.W. Ayer & Son, filial de um importante e tradicional grupo americano com matriz na Filadélfia. Trabalhávamos para clientes como Parker Pen, Leite Hinds, Ford, General Eletric, Kibon e Gessy. Foram sete anos de muito aprendizado. Lá tive a sorte de fazer um trabalho muito importante em minha carreira: o desenvolvimento do primeiro logotipo da Kibon.

E.H. - Além desse "case" significativo, quais outras campanhas o senhor destaca na sua carreira?
Wilda - Durante a minha passagem de um ano e meio pela Lintas, naquela época quase uma house-agency da Lever, desenvolvemos campanhas para os sabonetes Lifeboy, para a Lever e a Atkinsons. Na MacCann, para onde fui em 1945, atendemos contas de grande porte como Goodyear, General Motors, Admiral, Coca Cola, Du Pont, ICI, Guarany, Matarazzo e Vulcan. Lá, tive um banho concentrado de publicidade. Alarguei meus horizontes, já que na Ayer a maioria dos clientes eram multinacionais que mandavam quase tudo pronto para nós. Às vezes até traduzido. Eles tinham um português trabalhando na agência. Imagine! Os textos vinham todos na língua de Camões. E na Lintas haviam muitas limitações, pois se tratava de uma house-agency. Já na McCann criávamos tudo.

E.H. - Com quais profissionais de destaque o senhor trabalhou nesse período?
Wilda - Na Ayer trabalhei com grandes personalidades da propaganda brasileira como Orígenes Lessa, Renato e Ribamar Castelo Branco, Oscar Fernandes da Silva, Charles Dulley, Rosino e Urbano Zacchi e Jean Gabriel Villin. Na Lintas, trabalhei com feras como o Peter Mehlich e o Joaquim Alves, entre outros. O Ítalo Éboli e o Edmur de Castro Cotti foram meus companheiros na McCann. Quando estagiei na unidade desta agência nos EUA conheci Jack Tinker, um dos primeiros idealizadores das butiques de criação. O que mais tarde virou moda por lá. Aprendi muito, inclusive novas técnicas de ilustração. Não existiam fotos a cores. As fotos P&B eram coloridas manualmente. Nos EUA, também estagiei na estação de televisão NBC.

E.H - Como foi seu retorno para a Lintas?
Wilda - Foi em 1952. Desta vez não foi de passagem. Fiquei mais 11 anos. Integrei de início o "Plans Board" e, mais tarde, passei a "Senior Manager". Fizemos muitos lançamentos importantes: Omo, Rinso, Lux, Vinólia, Signal, Embassy. Em 65, após treze anos, apesar da Lintas esboçar uma abertura, eu estava cansado de toda aquela bitolação e pedi demissão. Fui enfrentar outros dragões. Desta vez, na saudosa P.A. Nascimento-Acar, uma agência efervescente (considerada diversas vezes Agência do Ano), onde eu assumi a direção de criação e muitas broncas. Afinal, administrar tantos talentos não era fácil. Muita gente boa passou pela P.A. como Eraze Martins, Sérgio Bertoni, Walter Jesus, Guilherme Quantt Oliveira, Neil Ferreira, entre tantos. Tive, também, duas meninas como estagiárias, a Christina Carvalho Pinto e a Magy Imoberdoff. Tenho muitas boas lembranças. Lembro de campanhas para ACEL, Sanbra, Mobil, Sudameris, Martini & Rossi, Erickson, Chrysler e Copersucar.

E.H.- O senhor nunca pensou em abrir sua própria agência?
Wilda - Em 1971, montei junto com a P.A., a Designo-plus, uma empresa especializada em comunicação visual e merchandising. Por três anos fiz excelentes trabalhos para clientes como Lafer, Mancisa, Martini & Rossi, Ello, Peg Pag, Copersucar e Wallig. Em 73, finalmente comecei minha carreira solo. Minha própria butique de criação. Durante muitos anos criei peças para empresas de alguns velhos amigos.


E.H - Como o senhor vê a propaganda de hoje?
Wilda - Eu penso que a publicidade de hoje reflete uma influência muito forte da TV. A atual geração de criadores recebeu uma educação essencialmente visual. Basta ligar a televisão e folhear algumas revistas para se ver isso. Acredito que essa selvageria visual vem criando uma confusão na cabeça das pessoas. Já não há mais diferenças entre as marcas. Mas sim, uma grande crise de personalidade.




(material extraido da secção entrou para história da dpto, devidamente - ou indevidamente editado )

Um comentário:

Anônimo disse...

Celso:
Fui aluno do Gerard Wilda nos idos (e bota idos nisso)de 1958, na Escola de Propaganda de São Paulo (a atual ESPM). As aulas de "layout" do Mr. Wilda me animaram a seguir a carreira na criação, percorrendo aqueles complicados estágios de paste-up, produtor gráfico, assistente de layoutman até conseguir elaborar layouts à mão (diferente da nova geração do computador).
Guardo até hoje as anotações feitas nas aulas do Mr. Wilda e ao revê-las dia desses, me surpreendi com a ainda atualidade de vários dos seus conceitos de meio século atrás. Há alguns anos, a ESPM de São Paulo homenageou Mr. Wilda com uma pequena exposição no saguão de entrada. Homenagem mais do que merecida, assim com este artigo do seu blog.
Um abraço do
Julio Bahr