almoço agradável. se fosse um ser publicitário como os outros, diria agradabilíssimo. publicitário, não sei se você sabe, adora os superlativos e hipérboles - principalmente no que diz respeito ao seu talento e seu salário. referência sempre maior ao talento do que ao dim-dim propriamente dito.aliás quanto menor o talento, maior a hipérbole sobre o excesso de e nunca sobre a falta de, isto em sua auto-crítica. não posso dizer que seria assim inversamente proporcional, porque existem realmente os talentosos, que ainda assim, ou talvez por causa disso mesmo, não dispensam a hipérbole. deve ser por isso que durante muito tempo falou-se que o melhor negócio do mercado era comprar um publicitário(ou homem de marketing, primo filho de casamento entre primos de primeiro grau) pelo preço que ele vale e vendê-lo pelo preço que ele acha que vale. os poucos publicitários modestos que conheci, traziam a modéstia no sobrenome de família ou no apelido, na maioria das vezes jocoso. e os que realmente eram, não o são mais: ou porque morreram ou porque deixaram a profissão. quanto a mim, a modéstia me impede de fazer qualquer comentário. quanto a ele, deixemos por conta da sobremesa que ficou para outro dia, quem sabe daqui a mais um ano.
mas voltemos ao almoço. agradável como disse. e talvez porque o ambiente nos lembrava um país que tanto gostamos, e onde trabalhamos por parte significativa de nossas vidas, não foi um almoço cusco. traduzindo o termo : onde não ficamos a dizer mal de ninguém(quer dizer não tão mal); a coscuvilhar a vida dos outros, a sexual principalmente; não nos deixamos levar pelas futricas e baixios de uma profissão que cada vez mais se presta a comentários, digamos assim, desniveladamente construtivos, tal o alto-nível baixo praticado à sorrelfa, e a descoberto, num exercício de auto-combustão que é hoje a atividade. publicitário adora falar mal de publicitário. isto não é novidade, o falar mal, em nenhum tipo de atividade. mas publicitário, claro, adora falar mal pensando que só ele faz isso. e que ninguém faz tal melhor do que ele. estando em pernambuco, deve-se acrescentar: ninguém no mundo melhor do que ele.
voltando mais uma vez ao almoço, além das recordações e saudades sinceras da terrinha, incluindo principalmente as gastronômicas e paisagísticas, servidas com os comentários entristecidos sobre a definhada economia portuguesa, que já do nosso tempo era franzina, apesar das loas - na época - a entrada do portugal claudicante e suplicante a comunidade européia, o que quase já nos faz mais portugueses do que os joaquins e manueles e nos quases-quases mais do que o dono do restaurante, por aqui há décadas. a ponto de já ter-se tornado por demais brasileiro. o que sentimos no sotaque, não da língua, mas no verdadeiro calão( sim, calão é gíria ou palavrão, lembram da expressão luso-brasileira, palavras de baixo-calão?)que é transformar o outrora bolinho de bacalhau referencia em batatatau por excelência, no que deixamos recado ao próprio e não a ementa, quer dizer no cardápio. isto acabou por render reminiscências também sem lágrimas de parte-a-parte, e boas risadas que apesar de boas não as deixamos barato a preencher a falta de bacalhau nos bolinhos - se tívessemos visto a conta antes, com certeza não nos ririamos tanto. e já agora, mais uma vez, entendemos porque ele se ria bastante mais do que nós, e da nossa autêntica bestialidade em contar anedotas onde os parvos são eles, os portugueses, e não nós, que sempre achamos sempre e sempre que estamos sempre a levar vantagem, até sobre nós mesmos, quando a história mostra que não é bem assim, mesmo hoje quando portugal embica a proa - não se esqueçam que quem é do mar não enjoa.
isto posto, falamos sobre o futuro, o que com certeza também nos diferenciou da malta do presente que tem uma certa experiência no só ficar no passado pra trás. e como o futuro a zeus pertentece, hora do batente, para ele, pra mim do dormente, nos despedimos. e o almoço só não foi completo porque não finalizamos com um bom expresso - que não há em recife, por mais que se vangloriem as deltas de cá - e um moscatel, que é coisa de quem sabe que o vinho do porto só vai até certo ponto da garganta em seco.
abraços sinceros e uma despedida onde improviso provocativo: voltei recife, foi a desgraça que me trouxe pelo braço( a truca só vale para quem conhece o hino da volta ao recife, argh!) gargalhamos e assim como começamos o almoço, nos despedimos com a amizade preservada até o próximo almoço que quanto mais distante melhor.
almoçassemos nós todos os dias e seríamos inimigos, sequer cordiais. a natureza humana do publicitário não vai além disto.
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