Há cerca de um ano, Maurice Levy fundou uma hotshop em Paris, de nome Marcel, em homenagem ao fundador da Publicis, Marcel Bleustein Blanchet. Fiquei um tanto surpreso pois Maurice Levy sempre demonstrou uma certa aversão a este tipo de agências. É conhecido o seu ponto-de-vista que uma hotshop, contrariamente a uma agência «tradicional», pode ter boas ideias esporadicamente, mas que o mundo hoje faz com que os clientes exijam consistência e constância no tempo. Na prática isso significa que, mais cedo ou mais tarde, acabam por se cansar da sua hot shop.
A Marcel lá começou com grande fanfarra, como é hábito nestas coisas. E ganhou logo a conta da Orange, conta emblemática em França e na Europa. O seu rendimento equivale ao de uma agência «top 5» em Portugal, portanto a coisa apresentava-se bem. Os seus fundadores e sócios Fred, Farid e Lambert, transformaram-se ainda mais em estrelas do panorama publicitário francês.
Para poder atender essa conta, a Publicis teve que abdicar de uma outra, cliente de longa data, a SFR (Vodafone). Os comentários foram os de sempre, a Orange é muito mais sexy e «criativa, a Publicis tinha feito bem e, além disso, mandou uma ferroada na sua grande rival, a Euro RSCG (para a qual trabalho). Em França, estas duas agências mantêm uma viva disputa, tipo Benfica-Sporting, portanto estava tudo dentro do estereótipo que todos esperam destas coisas.
Um ano depois, Fred, Farid e Lambert, decidem deixar a Marcel (!)...... e ir trabalhar para a concorrência (criaram uma agência denominada FFL, em associação com Vincent Bolloré, o maior accionista da Havas-Euro RSCG). A Marcel lá continua, sem a sua alma, tipo «tem-te não caias» à espera de ser possivelmente fusionada com a Publicis para que esta, fiel à filosofia do seu chefe, venha assegurar a consistência e constância que os clientes reclamam. A SFR foi-se, vamos ver o que acontece com a Orange...
Que pena que Maurice Levy, um homem inteligente que constituiu um dos maiores grupos de comunicação no mundo, não tenha acreditado em si mesmo. Teria evitado uma humilhação pública e, provavelmente, um problema de negócio.
Este episódio vem provar, de uma outra forma, o meu ponto de vista em matéria de hotshops. Primeiro que, no negócio, o talento tem que ser enquadrado - a criatividade é um assunto demasiado sério para ser deixado exclusivamente na mão de criativos. Eles são, de alguma forma, os seus próprios piores inimigos. Por outro lado, que uma hot shop, como o seu nome indica, depressa se transforma num enorme problema de negócio. Ora, a publicidade é um negócio, não um exercício diletante ao serviço dos seus criadores. Por detrás dela há pessoas que trabalham, ganham os seus salários, de si dependem, na agência como no cliente.
Portanto, apenas quero fazer uma observação final. Pode ser que venha a mudar de opinião sobre as hotshops. A vida já me ensinou que as circunstâncias mudam, e nós também. E, como diria Mário Soares, só os burros é que não mudam de ideias. Mas, por enquanto, fico na minha: mais vale uma boa agência que a mais «hot» das «hot shops».
Perguntem ao Maurice Levy e à Orange.....
hot shops..... no briefing, do ricardo monteiro, ceo da euro rscg portugal e américa latina, que acaba de levar uma perna da fischer portugal que sacou da euro rscg a conta da sagres que por lá andava a oito anos.
p.s. a fischer em portugal instalou-se como basicamente uma shop, que nem é tão hot assim. isto não invalida parte da argumentação do ricardo, mas ele podia ficar sem essa na hora de ir ao banheiro.
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