sábado, julho 29, 2006

novamente na idade do leiaute da pedra lascada?

Para quem nada tem a dizer, as palavras são úteis.
- Goethe

As peças vão-se encaixando, aos poucos. Na primeira vez em que vi - e não gostei - a moça da TV fazer um gesto com a mão significando "faz um vinte-e-um" veio-me a reflexão: gostar ou não gostar, pessoalmente, nunca foi nem será o critério para avaliar uma campanha de comunicação. Era claro que a campanha tinha o mérito de ter criado um bordão, como se diz, que se podia adaptar a uma variedade de suportes, desde um comercial de TV de 15 segundos, até um outdoor, cartazete de ponto de venda ou anúncio impresso.

Depois vieram outras: a do nã-nã-nã, da cerveja, mãe ou tia torta desta execrável da-da-da do refrigerante, o gestual da dor-de-cotovelo, dos automóveis- e, por que não, o ÃO do Estadão?...

Então li uma palestra, feita em Cannes, por Lord Maurice Saatchi, propondo que a nova fórmula da propaganda moderna seja: quanto menos palavras, maior a possibilidade de a estratégia ser eficaz. Literalmente: a posse de uma palavra é o ativo de maior valor na era digital. É bem verdade que, nessa palestra,Lord Saatchi não conseguiu dar um só exemplo de campanha de sucesso baseada em uma única palavra. Mas acentuou, sem dúvida,o conceito de que o caminho do sucesso, na nova propaganda, passa pela descoberta de um ingrediente único, singular, que se possa associar positivamente à marca de um produto ou serviço.

Estará aí, talvez, o germe da grande insatisfação que sentimos diante da propaganda atual?

A minha geração começou a trabalhar em propaganda em cima do que se chamava "copy". O texto dos anúncios impressos - e, algumas vezes, as suas ilustrações - determinavam a qualidade da percepção dos consumidores. "Se é Bayer é bom", "É melhor e não faz mal" - e depois – "Isso é que é", para Coca Cola. "Pense pequeno para o Fusca.

A chegada da TV trouxe um formato novo e generoso (embora não o considerássemos assim, na época) no comercial de 30 segundos: palavras, imagens com cores e movimento, trilha sonora e pack-shots, para encerrar. Reputações foram construídas- nesses limites - tanto para os produtos anunciados como para os profissionais que,em duplas de criação, bolavam as mensagens. A bonança durou quase meio século. Quase todas as grandes campanhas das últimas décadas, em especial até os anos 90, desenvolveram-se a partir de um memorável comercial de 30 segundos.

E agora? A evolução da tecnologia resultou numa multiplicidade de suportes para a transmissão de idéias - e em novos hábitos das pessoas, em relação à mídia, que trouxe sérias dissonâncias ao próprio processo de percepção. Diante da tradicional tarefa de transformar estratégias em símbolo, os publicitários estão ficando, literalmente, sem palavras.
Não é um problema de fácil solução. Na verdade, encontrar o caminho tornou-se, para a nova propaganda, uma estratégia para a própria sobrevivência. Pode-se até aceitar que nã-nã-nã e da-da-da sejam precursores de alguma coisa. Mas corre-se o risco de que - de bordão em bordão, de grunhido em grunhido - em vez de evoluir, a propaganda reverta à idade da pedra.

nã-nã-nã-da-da-da, do j.r.w.p.

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