em 2013, elisabeth warren,
senadora dos eua, perguntou: quanto tempo ainda será necessário para se fechar
um banco como o hsbc ?
Estamos em 1860.
O Império Britânico acaba de vencer a famosa “Guerra do Ópio” contra a China,
talvez uma das páginas mais cínicas e criminosas da história cínica e criminosa
do colonialismo. Metade do comércio da Inglaterra com a China baseia-se na
venda ilegal de ópio. Diante da devastação provocada pela droga em sua
população, o governo chinês resolve proibir radicalmente seu comércio. A
resposta chega por uma sucessão de guerras nas quais a Inglaterra vence e
obriga a China a abrir seus portos para os traficantes e missionários cristãos
(uma dupla infalível, como veremos mais à frente), além de ocupar Hong Kong por
155 anos.
Em 1860, guerra terminada, os ingleses tiveram a ideia de abrir um banco
para financiar o comércio baseado no tráfico de drogas. Dessa forma apoteótica,
nasceu o HKSC, tempos depois transformado em HSBC (Hong Kong and Shangai Bank
Corporation), conhecido de todos nós atualmente. Sua história é o exemplo mais
bem acabado de como o desenvolvimento do capitalismo financeiro e a
cumplicidade com a alta criminalidade andam de mãos dadas.
A partir dos anos 70
do século passado, por meio da compra de corporações nos Estados Unidos e no
Reino Unido, o HSBC transformou-se em um dos maiores conglomerados financeiros
do mundo. No Brasil, adquiriu o falido Bamerindus. Tem atualmente 270 mil
funcionários e atua em mais de 80 países. Sua expansão deu-se, em larga medida,
por meio da aquisição de bancos conhecidos por envolvimento em negócios
ilícitos, entre eles o Republic New York Corporation, de propriedade do
banqueiro brasileiro Edmond Safra, morto em circunstâncias misteriosas em seu
apartamento monegasco. Um banco cuja carteira de clientes era composta, entre
outros, de traficantes de diamantes e suspeitos de negócios com a máfia russa,
para citar alguns dos nobres correntistas. Segundo analistas de Wall Street, a
instituição financeira de Nova York teria sido vendida por um preço 40%
inferior ao seu valor real.
Assim que vários jornais do mundo
exibiram documentos com detalhes de como a filial do HSBC em Genebra havia
lavado dinheiro de ditadores, traficantes de armas e drogas, auxiliado todo
tipo de gente a operar fraudes fiscais milionárias e a abrir empresas offshore,
a matriz emitiu um seco comunicado no qual informava que tais práticas,
ocorridas até 2007, não tinham mais lugar e que, desde então, os padrões de
controle estavam em outro patamar. Mas não é exatamente essa a realidade.
Em julho de 2013, a senadora norte-americana Elisabeth Warren fez um
discurso no qual perguntava: quanto tempo seria ainda necessário para fechar um
banco como o HSBC? A instituição havia acabado de assumir a culpa por lavagem
de dinheiro do tráfico de drogas mexicano e colombiano, além de organizações
ligadas ao terrorismo. Tudo ocorreu entre 2003 e 2010. A punição? Multa
irrisória de 1,9 milhão de dólares.
Que fantástico. Entre 2006 e 2010, o diretor mundial do banco era o
pastor anglicano (sim, o pastor, lembram-se da Guerra do Ópio?) Stephen Green, que, desde 2010, tem um novo
cargo, o de ministro do gabinete conservador de David Cameron, cujo governo é
conhecido por não ser muito ágil na caça à evasão fiscal dos ricos que escondem
seu dinheiro. Enquanto isso, os ingleses veem seu serviço social decompor-se e
suas universidades serem privatizadas de fato. O que permite perguntas
interessantes sobre quem realmente nos governa e quais são seus reais
interesses.
Alguns fatos são bastante evidentes
para qualquer interessado em juntar os pontos. Você poderia colocar seus filhos
em boas escolas públicas e ter um bom sistema de saúde público, o que o levaria
a economizar parte de seus rendimentos, se especuladores e rentistas não
tivessem a segurança de que bancos como o HSBC irão auxiliá-los, com toda a sua expertise, na evasão de divisas e na fraude fiscal. Traficantes de armas e drogas
não teriam tanto poder se não existissem bancos que, placidamente, oferecem
seus serviços de lavagem de dinheiro com discrição e eficiência. Se assim for,
por que chamar de “bancos” o que se parece mais com instituições criminosas
institucionalizadas de longa data?
(quem nos governa, do vladimir
safatle, na carta capital)
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