quarta-feira, junho 10, 2015

quando até meio&mensagem incentiva a coragem é porque temos cristalizados um meio e mensagens acovardados até o piloro

Desde que assumi a chefia da redação de Meio & Mensagem, tenho 

cumprido uma extensa e produtiva agenda de encontros de relacionamento 

com os líderes de boa parte das maiores agências do País. Tais almoços e 

visitas têm rendido conversas tão valorosas que dariam assuntos para 

diversos editoriais. Certamente muitos desses temas ainda serão abordados 

futuramente neste editorial.


Um de meus bate-papos mais peculiares deu-se no escritório da Talent, numa 

manhã dessas, quando fui recebido para um café da manhã pelo CEO José 

Eustachio e o executivo-chefe de operação e criação João Livi. Prosa vai, 

prosa vem, a pauta se encaminhou para o acirramento do debate político 

social e a consequência desse cenário de maior intolerância para a 

comunicação das empresas — que, tradicionalmente, relutam em se 

posicionar firmemente quando uma polêmica esquenta os ânimos de 

diferentes grupos, em maior ou menor escala.

As marcas, em geral e historicamente, sempre tiveram medo de opinião”, 

afirmou Eustachio. “Mas, cada vez mais, estar antenado com a cultura 

contemporânea, o que é primordial para as marcas, exige um 

posicionamento consistente. Precisamos ler mais romances e os clássicos 

da antropologia sociologia e menos os manuais de marketing.”


Ao que parece, mais pessoas que compartilham da visão humana de 

Eustachio estão tomando as decisões nas áreas de marketing de grandes 

companhias. Pouco a pouco, tem aumentado o número de marcas que 

assumem uma posição contundente diante de temas considerados tabus. 

Ainda mais importante do que isso é fincar o pé se existe a convicção do 

caminho escolhido quando o conceito das campanhas foi definido — e não 

ficar à deriva, ao sabor dos humores dos ventos que sopram ora para cá, ora 

para lá.


Foi essa linha que O Boticário seguiu, na semana passada, ao permanecer 

fiel à ideia original do filme “Casais”, criado pela AlmapBBDO para promover 

Dia dos Namorados. Incomodadas com o teor do vídeo, que mostra casais 

homossexuais (e heterossexuais) trocando presentes, duas dezenas de 

consumidores registraram queixas na plataforma Reclame Aqui. O caso 

chegou ao Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar). O 

julgamento acontecerá em julho.

"Boticário acredita na beleza das relações,presente em toda 

sua comunicação. A campanha aborda, com respeito e sensibilidade, a 

ressonância atual sobre as mais diferentes formas de amor,

independentemente de idade, raça,gênero ou orientação sexual”, justificou a 

companhia, em defesa de suascrenças corporativas.


Anteriormente, com menor ênfase, a Natura tomou postura similar, 

declarando que “acolhe a pluralidade de pontos de vista e valoriza a 

tolerância”. A maior concorrente de O Boticário foi criticada por suas 

inserções comerciais na novela global Babilônia, na qual o relacionamento 

homossexual entre as personagens de Fernanda Montenegro e Nathalia 

Timberg causou furor na ala conservadora dentre os telespectadores.


Assim como na vida, também na comunicação é impossível abster-se de 

prováveis desconfortos quando se assume uma postura singular diante 

de assuntos aos quais a concordância é um ser estranho. Não dá para 

agradar a todos. A boa notícia é que ninguém precisa ser unanimidade — 

nem mesmo as marcas.


O segredo da estratégia bem-sucedida passa, sim, por alinhar as ideias a 

serem propagadas com o propósito maior que determina a relevância da 

própria existência de uma empresa. Evitar assuntos polêmicos e buscar a 

neutralidade seguindo a cartilha das pesquisas de opinião é uma fórmula 

certeira rumo à mediocridade — um estágio imediatamente anterior ao da 

irrelevância.


( jonas furtado no editorial, da edição 1663, do m&m em 08 de junho de 

2015_.


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