quarta-feira, julho 28, 2010

evidências da decadência

. Os dois velhinhos passaram a noite enchendo a cara. Como nos temos em que eram jovens. E como naqueles tempos, resolveram encerrar a noite na zona do meretrício.

Mais pra lá do que prá cá, entraram numa daquelas casas com luz vermelha na frente e, excitados, foram direto à cafetina.

Que por sinal, justo naquela madrugada, não estava a fim de muita conversa. Chamou a “secretária” e cochichou:

“Vá aos dois primeiros quartos e coloque uma boneca de inflar em cada cama Não estou a fim de aturar velhos e bêbados. Nem de sacrificar minhas meninas com eles. Isso aqui não é asilo. No estado em que estão, eles não vão notar a diferença.”

Ordem rigorosamente cumprida, os velhinhos foram encaminhados para os quartos. Lá, tentam fazer o dever de casa.

Já na rua, de volta pra casa, eles se gabam do feito:

“Acho que a mulher que estava comigo, quando viu a minha espada, enorme e dura, teve um enfarto e desmaiou.”

“Desmaiou? Porque você acha isso?”

“Ela ficou fria, não se moveu um instante, não falou nada enquanto eu comia ela.”

“Pior aconteceu comigo”, disse o outro.

“Acho que a mulher era uma bruxa!”

“Uma bruxa!!! Por que cargas d'água você acha isso?”


“Bem, eu estava nas preliminares e dei uma mordida na bunda dela. Daí, compadre, o caos tomou conta do quarto.”


“Ela peidou na minha cara e saiu voando pela janela com ainda a minha dentadura presa na bunda.”


2. “A performance histórica do Brasil no Festival de Cannes este ano, com 57 Leões conquistados, em boa parte reflete também um aumento significativo na distribuição de troféus nas 12 premiações do evento. Foram nada menos que 890 estatuetas, número 32% maior do que no ano anterior, diante de um aumento de apenas 7% nas inscrições.”

890 estatuetas! Quando li essa notícia na capa da Meio & Mensagem do dia 05 deste mês,eu me lembrei.

3. Lembrei-me do encerramento do evento durante os anos – muitos atrás - em que freqüentei o Festival. Então, havia um Leão de Ouro em disputa. Acho que tinha também o de Prata e o de Bronze, não tenho certeza, além dos diplomas. E o nome da peça vencedora era guardado debaixo do mais absoluto segredo. Ninguém, nem mesmo os jurados, sabia quem era o vencedor.

Você há de imaginar o suspense que nos dominava. As emoções e os fofocas que percorriam a platéia, antes e depois que o nome do premiado era revelado, em sessão de gala por ocasião do encerramento do evento. E tinha o orgulho de quem tinha vencido o certame. Era, pelo menos naquele instante, o campeão do mundo.

Durante toda a semana do Festival, diariamente, a gente não despregava o olho do telão. Queria ver todos os comerciais inscritos, e para tanto enfrentava sessões que começavam logo cedo e terminavam no fim da tarde. Durante as sessões aplaudia os bons e vaiava os ruins. E à noite nos reuníamos em algum bar para discutir e tentar adivinhar quem seria o vencedor.

3. Li a notícia e fiquei triste: 890 estatuetas! O Festival de Cannes foi vulgarizado. O Leão deixou de ser a conquista inesquecível de um contra o mundo. Passou a ser mais um.

Cannes cedeu à cobiça e se transformou em uma máquina de ganhar muito dinheiro. Em compensação perdeu o antigo valor. Agora é mais um prêmio. Uma pena.

Agora, quem vai a Cannes age como os dois velhinhos bêbados: embriaga-se com a beleza da França e com as atrações do evento,e ao invés de transar gostosamente com o que há de melhor no mundo em talento, contenta-se com qualquer coisa. Aí, quando tem sorte - porque quem ganha pelo menos um de tantos prêmio só precisa de um pouco de sorte – e traz pra casa uma boneca, digo, um leão decaído, que já não tem o valor de outrora. Afinal, além dele outros 889 estão passeando por aí. Segurando os papéis de uma prateleira qualquer.

(a decadência de cannes, do eloy simões, que para os ganhadores de leão de hoje é que seria um decadente. será?)

Um comentário:

Alex Camilo disse...

Tu ainda não viste nada, caro Celso, dá uma olhadinha nisso aí:

http://martpet.wordpress.com/2010/07/26/leao-de-ouro-de-cannes-em-pernambuco/

Um abraço

P.S.: por onde andas?