terça-feira, janeiro 17, 2006

a mulher de um milhão e quatrocentos(por enquanto) mil doláres

Até o Brad Pitt e a Angelina Jolie, que se recusam a sair em uma foto que não tenha o bebê indochino adotado, eu sempre achei,que só filho bonito que tinha dono. Em propaganda é a mesma coisa, tem as contas que todo mundo quer trabalhar e aquelas que nem tanto. Aqui a linguiça do churrasco, o bombom de pêra da caixa da Garoto, ou seja, o que ninguém quer nem de graça é conta de remédio. Aí no Brasil é proibido anunciar alguns remédios mas aqui é o que paga o leitinho desnatado e orgânico do publicitário novaiorquino. É comercial atrás de comercial, remédio pra tudo que você imaginar. Até porque remédio é objeto de desejo aqui, nunca vi. As farmácias são tipo shopping center. E eu tenho uns amigos muito engraçados que as vezes passando na frente da Duane&Reade, que é das maiores redes de farmácia daqui, falam: vamos entrar pra dar uma olhadinha no que tem de novo?

Minha experiência nesse maravilhoso mundo da droga tinha se resumido a um anúncio de revista. Adivinha pra quê? Vioxx. Pois aprovaram o anúncio e dias antes de sair, veio o escândalo que tirou o remédio de circulação. Tuto Buena gente esses meus clientes. Mas como tem sempre alguém pensando um jeito de ganhar dinheiro em cima do que for, o que começou a bombar na TV foram os comerciais dos escritórios de advocacia oferecendo serviço pra ex-usuários de Vioxx que queiram processar o cliente. E eu lá, quietinha, aliviada de ter saído pela esquerda nessa. Um ano se passou e eis que chegou um outro job. E não teve como escapar porque como era pra uma vacina de um vírus que atinge sobretudo mulheres, HPV, eles colocaram todas as meninas da criação. Isso foi em maio. Apresentamos as idéias pro cliente que assim sem saber exatamente o que queria, e com dinheiro pra torrar por aí decidiu filmar 5 opções e aí levar pra testar. E depois de testar, aí sim, filmar ainda mais bem feito o que foi eleito o melhor pelos grupos de pesquisa. Eu nunca tinha ouvido falar isso. Fazer story board, tá, vai lá. Mas filmar mesmo, com produtora, diretora, casting, locação, cinco comerciais diferentes e não veicular nenhum, eu hein?

Pois lá fui eu, filmamos no Central Park, verão, diliça. Fui de tenis pra correr nos intervalos.

Bom, passou-se o outono e eu pra falar a verdade nunca mais lembrei dessa bagaça. Aí tô sossegadinha no meu canto em novembro e entra o esquadrão das atendimentos da remedada avisar que o meu tinha sido o comercial que passou nos testes e que agora a gente ia filmar mesmo. Eu tentei imaginar o que era o filmar mesmo, já que pra mim, o outro tava mais que bom. Aos poucos eu entendi que o filmar mesmo era com dinheiro mesmo.

Como o objetivo era usar gente real e não atriz, começamos a procurar diretores não de comerciais mas de documentários.

Acabamos escolhendo uma que tem 2 Oscars, um pra um filme com o Woody Allen e outro com o Mike Tyson. E minha cara de falar então, Barbara, sabe qualé, assim, a gente vai falar de um super tema, remédio. Tadãaaaaa. E o pior, durante o processo involutivo que quase toda idéia passa, essa que já era relepepé virou mais chumbrega ainda porque agora nem gente real poderia mais ser. Tinha que ser atriz.

A única parte boa era que como são cenas externas e em Nova Iorque agora tá assim agradável oito graus negativos, a gente teve que ir pra Los Angeles por duas semanas. Uma pro casting e outra pra filmar.

Casting aqui é de uma seriedade danada. Pra começar é uma produtora separada e nao a produtora do comercial. Pra esse a gente entrevistou 78 mulheres. Entrevistas de tipo 20 minutos cada, conversa pesada, quem já tinha sofrido de câncer ou perdido algum membro da família. Tão pesado que tinha uma caixinha de kleenex dentro da sala porque a toda hora alguém começava a chorar. Depois disso afunilamos pra 45 e aí tem as call backs: você chama de novo para outro teste os atores que mais gostou. Desses ficaram 35.

Aí vai ver o figurino. Vou confessar que eu adoro essa parte. Vestir 35 mulheres de diferentes idades, tipos fisicos, raças. E o melhor é que algumas das peças no final ficam pra agência. Ou seja, vou confessar que eu tentei fazer muita atriz de 1 metro e setenta se espremer em sapatinho 35 e calça 36 que coincidentemente são os meus tamanhos.

Aí vamos às locações. Não tem essa do diretor escolher e você só ver na hora, não. A gente vai em cada locação aí também com o diretor de fotografia ver os melhores ângulos, luz, hora do dia pra cada cena. E só vai aparecendo gente e mais gente. No final a equipe são umas 60 pessoas. O Jeff meu namoradinho da ocasião foi também e no bar do hotel fez uma pergunta pra produtora aqui da agencia que eu nunca tinha tido coragem. Em quanto sai a brincadeira? Eu fiquei tão impressionada que achei que tinha que dividir com outros amigos publicitarios brasileiros: um milhão e quatrocentos mil dólares. Tô escrevendo assim por extenso porque é tanto zero que eu ia me confundir. Passou de um zero eu sou mais um a esquerda. Incluindo tudo. Segundo ela: edição e finalização. Mas sem contar a mídia. Tudo bem que são muitas diárias, a diretora é bambambam, várias locações, atriz filha do Gregory Peck, biritas no bar do hotel, mas ainda assim. Pra mim, que vim de Belo Horizonte, ainda onde a gente fazia um filme com cincão então nem se fala. Mas eu fiquei tão impressionada que tive que dividir.

A produtora é impecável. Por um motivo bizarro eles descobriram que eu gostava de uva passa (a ferida desse virus, HPV no homem forma umas verrugas escuras e enrrugadinhas tipo uva passa no bililiu dos rapazes). Meu mundo caiu porque relacionar minha comida preferida (a passa minha gente, olha o respeitcho) foi muito duro. Pois o produtor viu minha decepção e a partir desse dia, todo dia no café tinha uva passa pra destraumatizar a menina coitada. O hotel só por não ser minha casa já é 5 estrelas. Eu sou a mais bobona porque enquanto todo mundo gosta das coisas luxuosas a minha grande preocupação é quantos mini shampoos eu vou conseguir roubar até o final da viagem. Eu sou pequena então me sinto assim Gulliver em quarto de hotel onde tudo é pequenininho, geladeirinha, vodkinha, até camareira é baixinha, já percebeu? Nunca vi uma camareira alta.

Mas tudo tem um preço. E em dólar o custo é o seguinte: você vai, filma, mas se não ficar como seu diretor de criação gosta, não adianta culpar o diretor, o tempo, o casting, a locação. Como foi você que supervisionou tudo, se não ficou bom, foi falha sua. E é bom que você tenha prestado atenção e cada take.

Voltei, troquei de mala e fui pro Natal no Brasil. Voltei ontem e fui direto do aeroporto (buniiiiiiita) editar o comercial. Abro o email e duas surpresas boas: uma que eu vou receber a Revista Pasta do Clube de Criação e outra que aprovaram um comercial de Philips e que segunda a gente vai filmar. Em Roma. Eu que tenho uma queda pela italianada não consegui mostrar todas as minhas obturações quando ouvi a notícia. Eu tenho uma queda pelo pessoal desses lados. E um dia saí numa foto na coluna social do New York Post. Pro meu azar quem primeiro viu foi o meu namorado daqui.

- Honey (nunca imaginei na vida que alguém que não um borracheiro ia me chamar de honey), saiu uma foto sua com um tal de Francesco no jornal.

- Hã (ganhando tempo), ah, é meu primo que veio me visitar.

- Seu primo? Com esse nome italiano?

- Lembra que eu te falei que em São Paulo tem aquele bairro Bexiga, cheio de italianos? Então.


tudo ao mesmo tempo agora, da laura esteves, redatora da DDB/NY e recordista de chulé ao passar duas semanas usando melissinha e comendo queijo coalho no latão na bahia, palavras da própria.

Um comentário:

Alex Camilo disse...

O iteressante nesse post é que ele meio que me fez mudar de ideia sobre algumas coisas que eu já estava convencido de que eram o ideial(quem disse que cavalo velho não aprende truque novo?): eu cria que os criativos não deviam ser envolvidos diretamente com a produção dos filmes em si e que o papel da(s) produtora(s) era se virarem pra fazer o melhor trabalho possível. Achava que o lance era escolher a produtora, entregar o roteiro, fazer uma reunião de produção e depois voltar às demandas ordinárias do dia-a-dia enquanto alguém descascava o abacaxi. Pensar como eu pensava, principalmente num mercado onde os videomakers de batizado, baile de debutantes e casamento são mais profissionais que as produtoras, é no mínimo suicídio profissionais. Quantas vezes eu tive que sofrer vendo boas ideias serem sumariamente destruidas nas "produtoras" e a unica reação que podia ter era ficar puto, porem impotente. É claroi que vivemos numa realidade diferente, um inferno publicitário onde filme de 20 pilás é superprodução, na qual os clientes só liberam a produção um semana(na melhor das hipóteses) antes da veiculação e onde a criação vive tão presa as suas cadeiras pelas demandas ordinárias(leia-se jobs de ultima hora, mal brifados, sem tempo para pensar ou grana nenhuma para produção)empurradas por atendimentos que nunca dão não como resposta a clientes que nunca sabem o que querem. A partir de hoje eu é que vou fazer o parto dos meus filhinhos queridos e que se fodam as demandas ordinárias.