domingo, outubro 30, 2016

o que dói mais? coragem ou covardia? e o que sai mais caro, capitular pela verba ou a independência aos tostões?



Sobre não seguir a corrente, não usar uma ética descartável
e não pegar todo e qualquer trabalho visando apenas faturar



“ Coragem é colocar as suas crenças acima do instinto de auto-preservação ”
— David Droga.

“ Coragem é levar o negócio (da agência e do cliente) para lugares perigosos por uma boa razão ” — esta, infelizmente, sem o autor confirmando a ausência de método por essas bandas de cá.

Já no dia 11 de setembro de 2016, de uma rara conversa com Isay Weinfeld no Festival do Clube, reservei com cuidado uns muitos aprendizados. Entre tantas coisas, Isay falou sobre a relação de confiança que precisa ser estabelecida com o cliente e o quanto ele preza por cada detalhe:

“ Às vezes se esquece que a obra é para quem pediu, não para você. Eu não projeto para mim, projeto para o outro. ”

“ 95% do meu trabalho é psicanálise. Os outros 5% são sobre pensar em tudo o que foi dito ”.

Em 2002, sem mês específico, anotei em um arquivo de Word sobre a recusa de um tatuador. Segue o evento reescrito com tintas de hoje: Certo dia, na hora do almoço, adentrei em um estúdio de tatuagem com um colega de trabalho. Eu sabia exatamente o que queria, ele não. O tatuador pediu para que cada um descrevesse o que gostaria de fazer e, em seguida, observou calmamente os desenhos já existentes nos corpos daqueles estranhos. Por um tempo, ele pareceu absorto, distante e, enfim, deu o seu parecer: tatuo você na semana que vem. Já para o cidadão ao meu lado, ele não hesitou: não vou tatuar você.
O meu amigo inflamou-se de raiva, tentou encontrar uma resposta para aquela sentença. No afã, acabou dando uma carteirada: mas eu vou pagar. E o profissional já calejado por anos de estúdio, retrucou: um trabalho que eu não acho coerente dói mais em mim do que em você, prefiro não fazer.

Distantes no tempo e nos arquivos, enxergo nesses eventos pontos que se conectam em uma espinha dorsal. Na frase de John Hegarty há uma desconstrução inusitada e verdadeira. Coragem no Keynote, todo mundo tem, mas na hora de pagar a conta, a decisão é de um lado. Respinga em todos? Respinga, mas a tinta pesa mais para o cliente. É uma reflexão que nos ajuda a rebalancear o ego. David Droga abre o leque da bravura e inclui as duas partes. É necessário, sim, enfrentar esse instinto que pode ser o do bônus garantido no fim do ano, da cadeira confortável e do salário alto, dos vícios em apostar nos mesmos formatos, nas fórmulas que deram certo para o concorrente. Coragem é sobre andar por caminhos não trilhados lembra o anônimo que estava lá e eu não anotei.
Do quase silencioso Isay, retiro a observação sobre ficar atento para que o ego de quem faz não se sobressaia ao trabalho pedido. Não criamos para nós mesmos, não somos nós que habitaremos aquele ambiente, que vestiremos aquela campanha. A boa relação parte do entendimento verdadeiro sobre o outro, do que ele precisa e carrega junto à possibilidade do não.
Do tatuador, o rigor que sublinha a importância de manter a coerência sobre aquilo que você acredita ferir os seus princípios. Não é seguir a corrente, usar uma ética descartável, pegar todo e qualquer trabalho visando apenas faturar. Das anotações, percebo que retidão também não aceita desaforo.

(retidão não aceita desaforo,do andré kassu, pica grossa da
crispin porter + bogusky brasil, in opinião no meio&mensagem)




segunda-feira, outubro 24, 2016

vinde a mim as criancinhas ?

*Publicidade infantil e os efeitos danosos às crianças: até quando?

Não é a publicidade que deve se autorregular, mas deve ser regulada de acordo com as leis
Desde a famosa propaganda dos anos 90, a publicidade infantil perdeu muito da sua inocência e hoje, liderada pela indústria de brinquedos e de alimentos, é ela o alimento perfeito para a insaciedade que ronda os nossos pequenos. E o pior: longe dos olhos zelosos dos pais, que estão na labuta! Eu conversei com um diretor de criação de agência de propaganda sobre as estratégias para fisgar a atenção das crianças, e ele confessou: criar uma necessidade na criança! Ela acreditará que precisa daquilo. Mas, ao contrário dos adultos, está despreparada para entender que precisar é diferente de querer, e se sente, na ausência do objeto desejado, deprimida nas suas condições de crescer de maneira saudável.
É por isso que, nas nações mais desenvolvidas, a publicidade infantil é praticamente banida! Vale até a contra-publicidade, como a que eu vi no aeroporto de São Paulo, onde o banner enorme com a foto de uma criança negra gordinha era um alerta contra a obesidade infantil.
Exemplos são Inglaterra, Alemanha, Canadá, e, no limite, a Suécia, país que proíbe, e não apenas restringe, publicidade dirigida a menores de 12 anos antes de 21h.
No país como o Brasil, que erotiza até garrafa de cerveja, transformando-a num corpo de mulher, a publicidade infantil – e ela é ainda mais poderosa nos canais internacionais da TV paga dedicados exclusivamente às crianças -, alicia, forja, confunde, ilude e está associada a distúrbios como transtornos alimentares e obesidade; erotização precoce, estresse familiar; violência e delinquência.
A cartilha, produzida pelo Instituto Alana, uma associação sem fins lucrativos, explica, por exemplo, que o delito mais praticado pelos adolescentes com história de delinquência é o roubo qualificado, ou seja, o desejo de agregar a si o “valor” que vê no outro. O meu amigo publicitário me dizia como um personagem de desenho infantil que as crianças adoram traz, no formato da cabeça, a angulação dos órgãos genitais masculinos, incluindo associações de cores e texturas, numa linguagem subliminar que é tão típica da propaganda, acessando partes do cérebro que vão além da consciência racional.
É esse o jogo da publicidade: despertar o mais puro desejo do consumidor com base em identidades, arquétipos e padrões pré-construídos que são ainda mais nocivos às crianças. A cartilha feita pela ONG Alana é apenas um dos produtos da corajosa campanha disponível no site www.criancaeconsumo.org.br e demonstra como o incentivo à bebida também atinge em cheio as crianças.
Os especialistas questionam: por que a propaganda do cigarro foi banida desde 2000 e a das bebidas continuam causando estragos em baixinhos e grandões, sendo hoje os fabricantes de cerveja os principais anunciantes na TV brasileira, a qualquer hora do dia? Talvez o aspecto mais preocupante nesse grande marketing infantil que se tornou a televisão, um mercado de ilusões sem limites e pudores, é a venda do conceito vazio de felicidade, tão bem traduzido pelas propagandas de margarina, com seu arquétipo de família feliz, branca, elitista, vendo a camada de margarina derreter-se num pão quentinho, numa linda manhã ensolarada numa cozinha também branquinha.
Não é a publicidade que deve se autorregular, mas a Constituição e a lei brasileira que colocam o Estado como responsável por afastar a criança e o adolescente de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, termos usados no art. 227 da Constituição. A presença de crianças em peças publicitárias também ofende a Carta Magna, que proíbe, no art. 7º, qualquer sorte de trabalho infantil. E, em que pese toda o discurso democrático da liberdade de expressão e da não censura perpetuado pelo marketing infantil e pelos donos de mídia, e o meio internet não está fora disso, a verdade é que a lei brasileira proíbe a publicidade infantil, mesmo que não o faça de maneira explícita e direta.
No exame de projetos que tramitam na Câmara sobre publicidade, é sempre remar contra a maré o esforço para tornar mais claro, por exemplo, o que está dito no art. 37 do Código de Defesa do Consumidor, que proíbe a publicidade enganosa ou abusiva, também entendida como aquela que “se aproveita da deficiência de julgamento e experiência da criança”. Mas nem a Constituição brasileira, nem o Código de Defesa do Consumidor, nem a Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança são suficientes para derrubar a ofensiva publicitária voltada para as crianças no Brasil, setor este que é muito auto-regulamentado, mas que domina como ninguém as práticas de burlar as regras que ele mesmo criou, com imagens, símbolos, estratégias e narrativas tão poderosas quanto danosas na arte da persuasão ao consumo exagerado e à insaciedade perpétua.
O que chama a atenção no trabalho realizado pelo Instituto Alana é a clareza da abordagem que demonstra, sem meias palavras ou discursos dissimulados, como a publicidade infantil colabora, por exemplo, para o fato de que mais de 15% das crianças brasileiras hoje sejam obesas e 33% estejam com sobrepeso, segundo dados do IBGE. É uma realidade peso-pesado que deve ser enfrentada com alterações, sobretudo, no Estatuto da Criança e do Adolescente, que sequer traz, no corpo da lei, a palavra propaganda ou o conceito de publicidade.
Quando a gente entende que o mais perverso é o fato de que estão mais expostos à publicidade infantil justamente os filhos das famílias de menor poder aquisitivo, que passam mais horas na frente da televisão, o enfrentamento do tema torna-se ainda mais urgente: sem falsos discursos de censura e sem perpetuar a falácia da liberdade de expressão, que na verdade se traduz na plena liberdade para explorar as ilusões infantis, num mundo da fantasia que a publicidade domina como ninguém.
por beth veloso, jornalista e consultora legislativa da câmara dos deputados nas áreas de comunicações, ciência e tecnologia, para o portal vermelho,via caros amigos.

terça-feira, outubro 18, 2016

o(s) bonequinho(s) não gostam

Filme de Costa-Gavras relata a origem comum dos estados autoritários e como se dão as coisas neles: decide-se dar à polícia carta branca para atuar.

Há filmes que de tempos em tempos devem ser revistos. Permanecem sempre novos e universais. São os verdadeiros clássicos. Assim como ocorre com livros aos quais se recomenda várias leituras ao longo da vida, algumas produções políticas do diretor grego Constantin Costa – Gavras, naturalizado francês, de 83 anos, são clássicas. Z (de 1969), A Confissão (1970), Estado de sítio (72) Amém (2002)  e Seção especial de justiça, de 1975.
 
Mesmo na mais frívola irresponsabilidade, com esses filmes fica mais difícil ignorar a origem comum dos estados autoritários e como se dão as coisas neles. Desenha-se, nos filmes de Costa-Gavras, o processo de deterioração do caráter dos protagonistas da vida pública que sucumbe ao sofrer repulsivas torções e distorções, ou diante de pressões e ameaças políticas e policiais - veladas ou não -, ou face à chance, de repente aberta, de legalizar o assalto ao poder. 
 
Section speciale, co-produção França, Itália e Alemanha, oferece uma régia lição sobre o assunto, com os diálogos magistrais do escritor Jorge Semprún, comunista militante do Partido Comunista Francês, de primeira hora da época, assim como foi seu companheiro Costa-Gavras. Ele mostra a naturalidade das tenebrosas transações que ocorrem no mundo sombrio manipulado pelos donos ilegítimos do poder, nas ditaduras e nos estados de exceção – como o que está vigente no Brasil sob ocupação, hoje: um Estado de Exceção dentro do Estado de Direito, como disse há dias o jurista Pedro Serrano.*
 
No caso do filme, o cenário é a França ocupada de Pétain em agosto de 1941 e nela a justiça colaboracionista: ministros germanófilos, juízes hipócritas, promotores e procuradores subservientes,  advogados indiferentes, os carreiristas e os dissimulados; traidores e covardes de todos os tipos e calibres.


Para a corja, o fantasma da época foi o ‘’abismo da Espanha’’ quando era preciso evitar, a todo custo, que a França escorregasse para ele. O inimigo eram os anarquistas, comunistas e gaulistas. “Simpatizantes dos  partidos de esquerda,” um procurador conselheiro da corte especial alveja, no filme, à semelhança do ministro da justiça do momento, aqui,  mais preciso ao dizer: eles são ‘‘a escória da terra.”
 
A certeza nesse ambiente era a entrada dos exércitos alemães em Moscou, breve.
 
Enquanto membros do governo francês cultivavam pompas e vaidades na estação de águas de Vichy, em Paris jovens estudantes comunistas resistentes praticavam um atentado, no metrô, e matavam a queima roupa um alto oficial da marinha alemã nazista. A retaliação foi imediata. Para a punição exemplar, os alemães decidem fazer uma centena de reféns na cidade e decapitá-los na Plâce de la Concorde. Mas são dissuadidos e lembrados da guilhotina em praça pública, um dos emblemas da revolução de 1789.
 
A partir do episódio, a narrativa do filme segue desvendando as manobras do submundo jurídico para a criação fulminante (todas as medidas excepcionais devem ser promulgadas com rapidez para deixar atônita a população) de uma corte especial que julgasse resistentes e presumíveis maquis, em um tribunal de exceção com tintas de legalidade - a section speciale. Seis presos seriam escolhidos entre comunistas, judeus ou comunistas judeus acusados de pequenos delitos. Julgados a portas fechadas. Á sua revelia eles estavam previamente condenados à pena de morte.
 
Decide-se dar à polícia carta branca para atuar. A lei de exceção, por ser como tal, era retroativa. ‘’São medidas que servem à situação, mas não à Justiça,’’ reagem alguns juristas renitentes. Em seguida serão convencidos e cooptados. 
 
“Jogamos a Justiça na ilegalidade e a vergonha sobre a magistratura,” bradam. “Não. Trata-se de promover a ‘’salvaguarda nacional’’, replicam os que procuram comprar para si a boa consciência. “Aqui, não se trata de Justiça”, argumentam. “Vamos salvar cem reféns e para isto precisamos de seis condenados à morte.”
 
No início, alguns juízes ensaiam resistir à promulgação da lei antiterrorista que permitirá condenar qualquer um a qualquer hora. 
 
O leitor observa semelhanças? 
 
“A razão de estado deve ditar as decisões jurídicas,’’ justifica a si mesmo um magistrado. E prosseguem a farsa e a burla do julgamento até que um dos réus, (já condenado sem o saber), Sampaix, jornalista do jornal L’Humanité, órgão do Partido Comunista Francês, o PCF, decide mostrar que o rei está nu.”O povo francês julgará este dia,” diz. 
 
Em certo momento das discussões a incerteza bate à porta de um dos procuradores. “E se os alemães atolarem na profunda Rússia e os americanos chegarem às costas da Inglaterra?” Os demais tergiversam.
 
No fim de Seção Especial de Justiça os seis presos escolhidos entre a ‘’escória’’ das esquerdas são executados. Uma legenda informa: “Na Libertação, nenhuma medida séria foi tomada contra os magistrados que participaram dos tribunais de exceção. Eles funcionaram durante toda a ocupação.”
 
Todos aqueles juristas da section speciale, no entanto, foram julgados pelas suas próprias consciências, como anteviu Sampaix, o jornalista do L’Humanité, olhando-os cara a cara, diante da corte de exceção, recusando o embuste da defesa.




* O  jurista Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC-SP lembra que ‘’no caso Lula, o TRF-4 assumiu que está praticando a exceção, que a Lava Jato é um caso excepcional e, portanto, devem ser suspensas as normas gerais no caso, para o juiz atuar como queira. A Lava  Jato não precisa seguir as regras de processos comuns.” ( Rede Brasil Atual).
 
**

(leis de exceção e a vergonha da magistratura, por léa maria aarão reis, jornalista, na carta maior)






sábado, outubro 08, 2016

se,como diria o nélson, toda unanimidade é burra, vamos tornar o aquário mais inteligente *

o oceania, quer dizer o aquarius
Fui assistir o filme Aquarius numa expectativa inocente, influenciada pelas críticas pipocadas no Facebook e em sites de cinema e cultura. Não, eu não li todas, mas o frisson nas redes sociais me fez acreditar que seria um filme interessante de pagar pra ver. Fui lá, paguei, me sentei pra assistir. Antes de continuar meu raciocínio preciso me localizar: eu sou sapatão, preta, gorda, estudante e desempregada. Esses marcadores sociais são importantes ao destaque porque me encontro no não-lugar das representações políticas e midiáticas. Localizar as falas é um modo de explicitar a necessidade do reconhecimento dos sujeitos na sociedade brasileira, algo que raramente é feito a não ser para aquelas pessoas já marcadas socialmente (ou seja, euzinha mesma); sujeitos brancos, masculinos, heterossexuais se compreendem como universais pois não se localizam a partir dos marcadores sociais e vão perpetuando essa ideia torpe de que não partem de lugar algum, ou melhor, o ponto de partida é "isento".

Ledo engano, meus caros. Não existe neutralidade em nenhuma ação, isso é uma falácia pra vender publicidade e jornalismo que corrobora pra ideologia dominante, coisa de quem não quer reconhecer a realidade perversa que existe. Pois bem, voltemos ao filme: tive vontade de sair da sala de cinema pelo menos em 3 momentos! Mas eu realmente tive o impulso de levantar na cena em que tratava das empregadas domésticas da "família". Fui segurada pela minha amiga que estava ao lado e que me fez ver o filme até o final. Fiquei lá, contrariada, mas fiquei. Assisti tudo na promessa de que se tivesse a parte 4 eu não aguentaria e sairia mesmo! Esse foi o acordo.
"Se a intenção era chamar atenção para a forma com que a classe média trata as pessoas trabalhadoras domésticas, o filme não cumpriu o papel de comunicar e problematizar a questão. Não teve a proposta de desvendar essas relações, apenas de apresentá-las ao público que, em sua maioria, adorou e aplaudiu nas salas de cinema"
O ápice do meu incômodo foi quando soltaram a frase "Elas roubam e a gente explora. Justo", sobre a lembrança de uma empregada doméstica antiga que havia roubado a família. Engraçado que mostraram essa cena de "roubo" mas não mostraram a relação de exploração perversa da classe média para com suas trabalhadoras domésticas. O "justo" acabou sendo aquela relação de que "são quase da família". E se a intenção era chamar atenção para a forma com que a classe média trata as pessoas trabalhadoras domésticas, o filme não cumpriu o papel de comunicar e problematizar a questão. Não teve a proposta de desvendar essas relações, apenas de apresentá-las ao público que, em sua maioria, adorou e aplaudiu nas salas de cinema. Não teve um viés questionador como eu imaginava, dada a repercussão do filme. Para uma amiga, o filme foi mea culpa. Para mim, foi perfumaria.
Percebam o quanto a mídia é responsável por manter e alimentar o imaginário social racista, fazendo com que no cotidiano as relações sociais também se mantenham, ou seja, vocês se assustarem quando uma mulher preta chefia grandes projetos e empresas, o "espanto" é o racismo. Estranhar a presença de pessoas negras em cargos de responsabilidade ou em evidência cultural, é fruto do racismo que segue sendo reproduzido nas telonas, até mesmo quando este se propõe a algo mais "denunciante", mas que o fez sob a égide racial que estrutura as relações sociais brasileiras.
Não foi utilizado nenhum questionamento para além do que sabemos a respeito das práticas racistas e elitista daqueles que se julgam burguesia para não pertencer à classe trabalhadora como demérito do ser. A especulação imobiliária que contém no filme é algo florido e amenizado no sentido de que a busca por uma solução aparece como individual, de revanche na mesma moeda, de ameaça mas de manutenção dos acordos porque "fulano é da família". As hierarquias mantidas e gravadas serviram para reforçar ideologicamente o lugar que é imposto para as pessoas pretas nesta sociedade. A notar tanto aplauso e elogio sendo distribuídos por aí, isentos de uma reflexão sócio-racial, me fizeram compreender que esse filme serviu para a classe média se identificar com a história e não compreender a colonialidade violenta contida nas relações de poder ali filmadas. Então não acredito que tenha servido amplamente para quebrar questionar esses lugares hegemônicos, de práticas racistas e elitistas, pelo contrário, foi um mea culpa bem chulo que enfatizou o lugar da mulher preta, da trabalhadora doméstica, do porteiro ao salva-vidas, todo mundo tem que estar à serviço de uma pessoa cujo status social é a fonte que desenha as relações.


(aquarius: um olhar sobre a narrativa da classe média branca - por jéssica hipólito, na caros amigos)

o aquarius, quer dizer o oceania, em 1950

nota do blog: publicar o artigo não quer dizer necessariamente que concordamos com seu teor, até porque não vimos o filme ainda. mas é sempre um dado a mais para reflexão, equivocada ou não.