sábado, junho 16, 2007

premios de tróia, ou de trolha

Em 5 de junho último, abro o Estadão e vejo um anúncio de página inteira, da SulAmérica, se vangloriando por ter sido eleita “a empresa do ano” pelo “voto popular” dos leitores da revista Consumidor Moderno. Sabem por que? “Por sua qualidade do atendimento e estratégia de relacionamento com seus clientes”. Como campeã na área de seguros, a anunciante completa sua auto-apologia com este estranho slogan esmagador de concorrentes: “Satisfação, mais um benefício que só quem é cliente SulAmérica pode ter”.

Gente, o que é isso? Justo a SulAmérica? Será que o pessoal dessa revista, que se posiciona como defensora da ética na relação entre empresas e consumidores, que divulga o código de defesa do consumidor em seu site, que acolhe reclamações de leitores contra abusos de empresas...

Será que esse pessoal não pesquisou na mídia (e nos cartórios) para saber um pouco mais sobre a SulAmérica? Se tivessem feito uma simples busca no Google, já teriam sabido que esta seguradora é objeto de processos movidos pelos Ministérios Públicos dos estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Bahia, além de milhares de outras ações individuais de clientes (inclusive a minha, as de amigos e até de corretores).

O motivo desses processos, em que ela vem sendo condenada até o momento: tentativa de calote nos seguros de vida dos seus segurados mais velhos, cujos beneficiários, por motivos óbvios, estão mais perto de receber os seus seguros por morte natural... que ela não quer pagar! E o que fez então a SulAmérica? Mandou uma cartinha aos segurados, informando que, de duas uma: ou concordavam com um novo contrato no qual, para o mesmo benefício, teriam de pagar três vezes mais, ou eles cancelariam unilateralmente o seguro. Esta autêntica chantagem só não conseguiu ser perpetrada por decisões da Justiça, que obrigaram a SulAmérica a respeitar os contratos vigentes (decisões das quais ela recorreu, confirmando que não gosta mesmo de respeitar contratos com os consumidores).

Conhecendo esta folha corrida, o simples fato de aceitarem a SulAmérica numa lista de candidatos a um prêmio por bons serviços ao cliente já seria uma aberração total. Fosse eu o presidente deste júri, vetava de imediato a candidatura. Mas levar a coisa adiante, fazer os leitores de uma revista do “consumidor moderno” votarem nela, já é demais. Ou será que não é? Aparentemente não é porque, ao checar o histórico deste prêmio, verifico que, no ano anterior, a empresa premiada como a maior respeitadora dos consumidores foi... adivinhem... a Vivo!

Colegas editores desta revista, um pouco de semancol não faz mal a ninguém. Vocês não acham que fica no mínimo estranho a campeã de reclamações de consumidores nos Procons ganhar o prêmio do consumidor moderno num ano e a seguradora condenada na Justiça por calote aos clientes ganhar o prêmio no ano seguinte? Só se vocês estiverem agora definindo o “consumidor moderno” como o mais trouxa de todos, o maior engolidor de sapos e falcatruas das empresas.

Não sei como é feita a apuração dos votos dos seus leitores mas sendo estatisticamente improvável que, entre eles, haja uma proporção significativa de clientes das empresas “candidatas” aos prêmios, a maioria dos leitores irá votar, sem conhecimento de causa, naquelas que são mais conhecidas, ou seja, nas que têm maior recall, até por anunciarem mais na mídia. Uma coincidência feliz, aliás, para a revista, porque justamente estas empresas estarão mais propensas a anunciar depois a sua vitória nas páginas da própria revista, não é?

No dia seguinte ao deste anúncio da SulAmérica, quando eu já estava me refazendo do susto, eis que abro o jornal, desta vez a Folha de São Paulo, e deparo com um anúncio de página inteira da W Brasil, vangloriando-se pelo fato de Washington Olivetto ter sido eleito “O Publicitário Mais Confiável do País”, desta vez pelos leitores de outra revista... adivinhem qual... a Seleções!

Gente, eu tenho o maior respeito e admiração pelo WO e não duvido que ele seja de fato um dos mais confiáveis profissionais, e não apenas entre os publicitários. Seria até capaz de votar nele se fosse consultado. Rezei muito por ele quando estava seqüestrado numa casa quase vizinha da minha. Mas será que ele precisa desta consagração da Seleções? Ou será que é Seleções que precisa da boa imagem do WO para melhorar a sua de uma revista cheia de teias de aranha e notória pela “esperteza” de suas malas diretas que vendem gato por lebre, como observei em minha última coluna?

Está na hora de uns e outros (editores e candidatos) tomarem mais cuidado com certas premiações que cheiram a tudo, menos a escolhas verdadeiras e honestas. Não condeno os prêmios em geral, pois sei que há muitos que são sérios. Eu mesmo criei um, o Prêmio ABEMD, e pelo menos enquanto eu presidia o Júri, posso garantir que a seleção dos casos e os julgamentos eram exclusivamente técnicos e levavam em conta também o critério ético. Aliás, agora em 2007, quando nada mais tive a ver com esta premiação, confesso que fiquei um tanto perplexo ao saber que a SulAmérica ganhou também dois dos seus prêmios... Mas pelo menos não foi por respeito ao consumidor. Ufa!

(premiados por que e por quem, direto do derrapadas de marketing)

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