Quantas vezes você ouviu ou leu o termo “design sofisticado” nos últimos tempos? Um rápido passeio pelo Google pode nos dar uma estimativa: nada menos que 270 mil páginas promovem esse encontro semântico, e o número aumenta a cada dia.
Dá quase para considerar que design sofisticado é uma coisa só, de tanto que a dupla é associada. Esses dias ouvi um comentário cheio de autoridade e certeza, afirmando que isso era uma redundância, afinal, se é design, é óbvio que também é sofisticado. Será?
Que tal uma olhadinha no dicionário? O Aurélio é arrasador: sofisticado significa falsificado, contrafeito, adulterado; que não é natural, falsamente refinado, afetado. Não me admira. Pesquisando mais um pouco a gente descobre que sofisticar tem origem no verbo sofismar. Ainda bem que podemos sempre contar com a filosofia para nos explicar o mundo.
Vamos ver, então. Sócrates, aquele da Grécia Antiga, tinha uns amigos um tanto quanto debochados. Esses caras, autodenominados sofistas, acreditavam que não há uma verdade que sirva para todos os humanos – o mais perto que podemos chegar é em opiniões subjetivas sobre a realidade, já que a gente depende dos nossos sentidos para perceber e entender o mundo. Para exprimir essas opiniões usamos a linguagem como ferramenta. Então, para eles, quem domina a retórica tem o poder de decidir o que é real e a posse da verdade só depende do nosso talento persuasivo. Partindo desse pressuposto, os sofistas se divertiam em infernizar a vida alheia usando argumentos falsos formulados de propósito para induzir o interlocutor a tirar conclusões equivocadas da conversa. A técnica consiste em iniciar a argumentação usando premissas verdadeiras e ir deturpando o raciocínio até uma conclusão absurda ou inverossímil. Quer um exemplo? Quem faz mal a um ser humano precisa ser severamente castigado, concorda? Contaminar uma pessoa com uma doença contagiosa é fazer mal, confere? Todo mundo sabe que gripe é uma doença contagiosa, e todo mundo que tem gripe contagia os outros. Conclusão: todas as pessoas gripadas precisam ser severamente castigadas! Pegou?
É isso: uma pessoa sofisticada é aquela que faz afirmações capciosas, deturpa a verdade com argumentos aparentemente lógicos, fala as maiores barbaridades cheia de razão. Ainda não sei que caminhos sofistas levaram essa palavra a se transmutar em elogio, mas o certo é que boa coisa ela não indica. E aí, você continua achando que sofisticado é um adjetivo adequado para design?
Já que estamos falando de adjetivos, estou encantada com uma palavra que aprendi no último final de semana: desmodrômico. Não é sonoro, forte, confiável, sólido? Adorei!
O termo foi criado pelo engenheiro Fabio Taglioli que trabalhava na equipe de carros de corrida da Mercedes Benz nos anos 50. Ele o usou para denominar o sistema excêntrico de válvulas muito bem bolado por ele que dispensa molas para o fechamento. Hoje em dia, o mecanismo é usado nas motos de competição da lendária marca italiana Ducati.
O nome é mesmo bem apropriado. Desmos, em grego, significa controle, domínio. Dromos é caminho, traçado. Desmotrômico significa controlar a atuação em diferentes direções.
Acho que o design não tem nada de sofisticado. O design é, na verdade, completamente desmodrômico.
(design desmodrômico, da lígia fascioni, que com a mudança da foto no acontecendo aqui, ficou menos)
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