sábado, outubro 28, 2006

uma marca, um acount, um cliente, um designer e um puxão de orelhas

Não quero atrapalhar o trânsito, mas convem encostar à parede a fraca memória de marcas, que ficaram no destinatário esquecidas para sempre.As marcas de hoje, deixaram de ter valor físico. As próximas também e aquelas que carregam performance económica actual, ficam-se por isso mesmo, até à entrada do novo presidente do concelho de administração ou à vitória de uma próxima O.P.A., ou ainda por um aumento de capital.

Por conveniência do mau marketing, uma marca não deve conter valores estéticos que acompanhem os seus valores económicos e se a coincidência acontecer, o “tanto faz”, está igualmente para a marca, como o volume de negócio se encontra, para o que ela representa.É moda o ranking. Ops! Isto diz-me que nada está a mudar.Se ser global, confere ás marcas muito mais benefícios, isto segreda-me que passou a existir inovação no tratamento da imagem das globais marcas e que todas as outras estão lá, a um canto. Isto também nos diz, de que nada é parecido ao que se passava com o presunto no século dezanove. Verdade? Com os sapatos e margarinas também. Só que alguns resultados de hoje, aproximam-se dos facturamentos “de há séculos“.

A única relevância na alteração do conteúdo das marcas, -vejam só como fácilmente descobri - é o futuro. Hoje uma bela marca pode nada valer por, em segundos, ficar ultrapassada. Poucas marcas estão voltadas para o futuro.Todos os dias são imensas as médias marcas que se auto-destroiem por quererem ser,- como um forte branding,- os únicos beneficiários.
Recorre o marketing tradicional a inovações das marcas, que à partida revelam ignorância no tratamento das simbologias que as representam, por lhes atribuirem valores de exagero que pululam nos briefings - Não deixo de fora as grandes.
Definem-se técnicas, onde as arquitecturas passam pela mão esperta de “fabriquetas” de design, que vendem acima de tudo e também abaixo da própria competência, sistemas, para alimentarem os critérios de marketing que não tem poder de decisão. Lá em cima está a última palavra, a gosto, que alimenta as fortunas, para se pagarem projectos ocos e quando não o são, são mesmo iguais à apresentação ao anterior cliente e com igual retórica. O que foi “inteligentemente” modificado, foi a côr e a forma, as fases de implantação e tantas, tantas vezes, nem isso faz a diferença.

Um forte activo de uma marca, não está sempre no destinatário, mas só lá deveria residir quando necessário. Um activo considerável de qualquer marca e meto no mesmo saco as melhores globais, está no cêntimo que o puto* tem no fundo dos bolsos rasgados. O puto crescerá e o processo para o próximo impulso da compra é muito rápido. Tão rápido como a velocidade do esquecimento o faz evitar de voltar aquela coisa, que gosta de vestir com marca à vista, para mostrar à garota, quando ambos vão à pizzaria. Porque é barato. São os papás que decidem o barato das semanadas e não o brilho das marcas. Aqui, as margens actuais de qualquer roupita ou pizza, passam a ser iguais ás do passado. Tostões.
A atractividade dos mercados não se faz exclusivamente das marcas globais.
A grandeza da globalidade, ou a dimensão de cada partícula global, esgotar--se-á com a memória extenuada do passado e não tardará que só uma pequena parte delas consigam enfrentar o futuro. Advinhando-o. Coisa a que se tem dedicado uns bruxos, bem pagos mas sem culpa. Há sempre clientes desejosos por horóscopos.
Nenhum mercado hoje, se torna consciente dos valores de qualquer marca e a futuro.
Que fazer ?
A resposta é simples. Tão simples que parece receita de estagiário não remunerado.
Se não se tratou bem de uma marca no passado, para a marca enxovalhada, não existe futuro. Criemos a próxima, porque a cosmética só resolverá as varizes do marketing maltratadas, da vizinha. É preferivel amputar o mal com cirurgias profundas.Para uma marca já maltratada, nem auto-exames lhe vale.A Microsoft vale o que vale pelo seu passado da penúltima hora. O seu activo não se formou com a ponderação por períodos ou pela mudança das suas cores e sim pela análise dos acontecimentos da hora percorrida, minuto a minuto. Só há bem pouco tempo se usa a informação dos últimos meses a favor da mudança de algumas marcas. Para algumas já é tarde. A “Vodafone” e mais umas raras, vão vencendo o presente. Outras médias, como a Cervejaria Portugália, pertencem ao grupo das doenças irremediáveis, a partir de mil novecentos e dezasseis. Nos lacticínios corre-se o risco de nem se salvar a ponta da história e eu que construi “Matinal”, fazem agora dezanove anos, sinto nas prateleiras o silêncio desses produtos, quando querem dizer o verbo “ser”.
Quando fundei uma excelente empresa de design, faz agora dezasseis anos, inovei duas análises de branding, começando pelas marcas minhas concorrentes e percorrendo sempre o passado mais remoto também das marcas clientes. O objectivo, foi a aquisição de uma percepção, cujos resultados foram visíveis interna e externamente com reflexos positivos, todos os dias. Iniciavam-se os tempos da venda dos projectos e não dos manuais de normas. Nenhuma marca é livre mas não por isso, deve ser condenada a prisão perpétua e encarcerada em regras condenáveis, por longos anos.
Hoje, todos os manuais de normas são iguais, intelectuais e sem poder.
Hoje, qualquer designer com uma caixa G5 à mão é igual ao do lado, mesmo que a máquina do novo parceiro seja um G maior. O problema não reside na diferenciação do profissional criador, ou das suas ferramentas e sim na velocidade que os donos das marcas imprimem ou não aos negócios. As formas, as cores e os métodos, são desculpas para entreterem critérios de marketing que não podem fugir ao vício das apresentações. Razão suficiente para não existirem já criativos melhores. Por outro lado, as marcas aproximam-se, pelas ideias idênticas. A provocação, está na diferença dos custos da ideia.
Há que fazer muito pelas novas marcas, esquecendo a velha lealdade dos consumidores, porque a imagem envelhecida de uma marca costumeira é como uma obra respeitada, mas que ninguém deseja obter.Sobre a marca, terminei. Falta um acount, um cliente, um designer e um puxão de orelhas.
Tenho inveja de um bom acount e como a minha inveja não é um defeito solitário, resta esclarecer que tenho muito pouca inveja, porque não existem assim tantos administrativos ou gestores entendedores do assunto. Não nasceram para conceberem os caboucos das marcas, mas nada lhes devia custar ouvirem o designer ou a engenharia mais próxima, que muito contribuiem para as suas arquitecturas de vendas.
Um bom cabouco faz uma ideia melhor.
Não há ideia alguma que ao atrapalhar um acount não venha atrapalhar ainda mais um cliente. Por ser uma ideia e porquê?Há véus necessários com que o designer cobre uma ideia e há sempre alguma dificuldade em ver-se uma ideia, com e sem véu.
Qualquer ideia para uma marca é representativa de uma precepção futura de um negócio e aí é que o pão com queijo pede ou não manteiga. Quem disso sabe muito é o designer. Digo designer e não, fazedor de logotipos.Sobre o designer, nada mais é necessário.Sobre o cliente e o puxão de orelhas. O puxão de orelhas é normalmente dado no momento errado ao loby certo. Esqueci o cliente. É de propósito.

manuel peres e as marcas, texto extraido do site portugues www.truca.pt
(manual peres é designer e diretor de arte, tendo trabalhado no brasil inclusive)

* puto é criança, guri, piá, menino

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