quarta-feira, outubro 11, 2006

nome feio é apelido

Nomear empresas é um desafio que não raro supera a capacidade e o bom senso dos seus gestores. Não é à toa que há verdadeiras corporações internacionais especialistas em branding, como a Landor e Interbrand, que cobram verdadeiras fortunas (em dólares) para escolher um bom nome. Como a maioria das empresas não tem cacife para tanto, não custa evitar algumas práticas que podem atrapalhar (e muito) o sucesso do negócio:

Usar nomes associados a valores negativos: Qualquer que seja a identidade da empresa, não é possível que seus gestores considerem que coisas ruins possam traduzi-la com competência. Isso parece lógico, mas vejamos alguns casos reais: já vi uma loja de roupas chamada Xantagem (assim, com x mesmo). O que será que isso tem a ver com a identidade da empresa? Na dúvida, é melhor não fazer confidências à atendente…

Há um outro caso mais conhecido, o de uma famosa marca de jeans chamada dopping, cujo público-alvo é formado por jovens. A campanha que eu vi era genial do ponto de vista criativo e poderia até ganhar prêmios: o botão da calça lembrava um comprimido e o slogan era: “seu corpo pede”. Com certeza, essa empresa nunca poderá participar de qualquer evento que contenha campanhas anti-drogas ou seja em prol de uma vida saudável. Em época de Olimpíadas ou jogos Pan-Americanos, então, melhor nem aparecer. Arriscado demais, você não acha?

Delirar com invenções gramaticais: Bom, antes de começar, que fique bem claro que o tal do apóstrofo s (‘s) não existe na língua portuguesa (nem mesmo como plural de siglas, como podem pensar alguns) e, em inglês, indica possessivo. Assim, o Charle’s Restaurant, traduzido, nada mais é do que o nosso popular Restaurante do Carlos. Para quem acha que tem pouco glamour, tudo bem, mas cuidado para não se empolgar demais. O McDonald’s não tem nada depois do ‘s porque é uma marca tão conhecida que já se tornou sinônimo de restaurante fast food, então eles podem dispensar o resto. Mas e o que significa Skyna’s? A tal de Skyna é dona de quê? E Emporiu’s? (agora pegaram pesado, tem até um toque de latim). E a loja de bijouteiras Fascyniu’s? Será que pertence ao mesmo conglomerado do Motéis Classy’s e Delyriu’s e da papelaria Treku’s? Sinceramente, não sei…

Produzir erros grosseiros de tradução: É comum a tentação de usar nomes estrangeiros para dar uma suposta sofisticação ao nome, mas muita calma nessa hora. O que a língua escolhida tem a ver com a identidade da empresa? E mais ainda: será que a tradução está correta? Convém cuidar desses dois aspectos. Há casos de nomes estrangeiros que se justificam perfeitamente e têm tudo a ver com a empresa em questão, mas se a pizzaria é de sua família, que é toda brasileira e de ascendência italiana, por que usar uma palavra que em sânscrito quer dizer felicidade para dar nome ao lugar? Como a língua, nesse caso, não tem nada a ver com a identidade e nem a cultura da empresa, fica-se refém da pessoa que deu essa informação. Já pensou se vocês recebem alguém fluente no idioma e descobrem que aquilo era na verdade um palavrão?

Tem também o caso da farmácia chamada Familyfarm, cujo slogan é “a farmácia da família”. Aí o problema é que o nome foi só meio traduzido e provocou um equívoco: farm, como você deve saber, é fazenda em inglês, e não farmácia, como queriam crer os donos do estabelecimento. Há muitos outros casos de tradução pela metade ou erradas, pois algumas pessoas acreditam que retirando-se a última vogal da palavra ela se traduz automaticamente para o inglês. Ou será que você nunca encontrou por aí nenhuma Lanchonet ou Self-serve?

Escolher nomes impronunciáveis ou pejorativos em outras línguas: Vamos combinar que dar mancadas na escolha de nomes não é privilégio de empresas de fundo de quintal. Grandes multinacionais também têm os seus dias de vexame, principalmente quando atuam em vários países com línguas e culturas muito diferentes. Um dos casos mais notórios foi o da Pepsi, que chegou a investir fortunas para lançar no Brasil (e imediatamente recolher) o refrigerante Josta, que já existe em outros lugares do mundo. Tem gente que até hoje pergunta quando é que eles vão lançar a Jerda….

Pessoalmente me lembro da linha de shampoos e condicionadores da poderosa Revlon que se chamava Outrageous (algo como exagero, em inglês). A propaganda aqui chegou pronta e dublada (como é típico nessa marca), onde a moça loira mexia os lábios e o som que saía dizia que o shampoo “ultrages” era mesmo muito bom. Não é para se sentir ultrajada? É claro que se sabia que pouquíssimas brasileiras pronunciariam corretamente a palavra no original (algo como “aut-reigious”), mas a solução encontrada, de aproximá-la do português não foi muito feliz.

Provocar erros propositais: Está em curso um festival de Ys e Ks, THs e letras duplas, a maioria sem respaldo na nossa língua, assolando as marcas no país. Para que escrever casa com “k” e “z”? Por que Myranthe, Krepperya, Koysas da Kaza? E tem a loja que se chama Simulassão (é assim mesmo, tenho fotos para provar). Se a palavra não tem nenhum significado conhecido e nem se parece com alguma que tenha, aproveite e se esbalde. Mas se tem, cuidado. Quando todo mundo conhece a palavra, sabe como é a grafia correta e a vê escrita com erros, inconscientemente identifica a dissonância. E isso está grudado para sempre no nome. Já ouvi um empresário dizer que o nome é escrito assim para “ficar diferente”. Mas pense comigo: se você pendurar uma melancia no pescoço e sair por aí, também vai ficar diferente e chamar atenção. Mas será isso traz algum valor positivo para você? É assim que você quer ser lembrado?

Contradizer o negócio da empresa: O nome não precisa comunicar explicitamente os serviços e a área de atua, mas também não deve contradizer os valores mais essenciais da empresa que lhe dá o nome em particular e das que atuam no mesmo ramo em geral. Senão, como conceber um lugar chamado Bar do Cabelo? Não ria, esse caso é real e Cabelo deve ser o apelido do dono. Mas isso se choca com a idéia de higiene que qualquer lugar que vende comida deve ter. Há outros casos, como a clínica veterinária Só Cão que também atende gatos; da academia de ioga e meditação chamada Explosion e do Motel Santa Mônica (sem comentários).

E, para não dizer que não falei de flores, semana que vem seguem dicas de boas práticas, com exemplos positivos. Até lá.


nomes feios,da lígia fascioni que é engenheira eletricista, mestre em automação e controle industrial, pós-graduada em marketing e doutora em gestão integrada do design. autora do livro "quem sua empresa pensa que é?", é consultora empresarial na área de gestão da identidade corporativa, e colunista do www.acontecendoaqui.com.br

pra não perder a viagem, digo que com um sobrenome destes a lígia raspou a trave.

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