quarta-feira, janeiro 11, 2006

o homem foi crucificado em lugar da alface

etiamsi ommnes ego non
s.mateus,evangelho,26.35; s.marcos,evangelho 14.31

imaginemos que, movidos por interpretações histórico-factuais, descendestes das vítimas da inquisição, das cruzadas, dos gentios, protestasse contra o “badalar” dos sinos católicos, alegando que o iconismo auditivo é uma afronta aos seus antepassados, assassinados em nome da fé . mais um anacronismo ? aconteceu recentemente. absurdo ?

a quem pertence a imagem(idealizada) do menino jesus? a fé e as suas representações são propriedade da igreja e dos católicos ? não é preciso ser exegeta ou teólogo para constatar que atribuir a propriedade de jesus a quem quer que seja, instituição ou pessoa, é um acto de afronta ao próprio.

triste final de século.mais uma vez, as mesmas forças escuras que estiveram por trás dos milhões de mortes causadas pelo determinativo religioso voltaram a manifestar-se. e desta vez em frente a um shopping.

em nome de jesus, lagartas da fé, entoaram a mesma novena que sempre precede os diabólicos actos de(falsa)fé; e que resultaram por dizimar milhões de “ bárbaros”, gentios, pagãos. aqueles que tinham, e tem, uma interpretação, neste caso estética e comercialmente, difeferente do que seja o respeito , a fé, a louvação, o amor. não para com jesus, mas para com o “ bom-gosto” canônico.
a via-crucis prosseguiu quando um representante da APAN comenta a passagem, a invocar códigos genuflexoriamente dúbios, com respeito ao respeito,desconsiderando as características de um tempo onde a semeiose, no discurso semântico-sintagmático-gestáltico da sociedade, suas formas de comunicação publicitária e não-publicitária convergem, irõnicamente,para a consubistanciação do corpor de cristo com tudo e com todos, tal qual for a profetizado.

religião e publicidade não são tão antípodas com querem fazer parecer alguns fiisteus. religião, etimologicamente nascida do lati, religãre, como o próprio nome diz, significa religar. religar pois é uma função conotativa/denotativa da publicidade. que assim o faz, também com a utilização dos símbolos da fé e das diversas religiões, acervos culturais/simbólicos da humanidade. em contrapartida,as relilgiões também não vivem sem a publicidade, quer do ponto de vista hodierno, quer do ponto de vista do passado, quando foi ungida esta comunhão.

pioneira do merchandising, a igreja católica criou a procissão, evento precursor da divulgação icónica de massa. assim o fez na arquitetura das suas torres, os outdoors mais eficientes de todos os tempos; dos sinos, a vinheta mais sintéticamente persuasiva, superando-se no símbolo da cruz: o mais efetivo de todos, exemplar caso de reconversão de marca em seus signficados e significantes. tudo, obviamente, em nome da fé, o que originou, entre outros movimentos, as cismas, deflagaradas em boa parte, pelo carácter da comercialização do espírito original, fenómeno que antecedeu, em muito, as bases da actual sociedade de consumo.

por outro lado, a beleza e a pureza de imagens sempre chocou os católicos mais conspurcados pela consciência dos seus actos. a herança judaico-cristã amaldiçoa tudo que é bonito. é depressivo o cenário católico da dor, da tristeza, da auto-flagelação, do dilacerament, como prova fiada da fé, as demais religiões são mais felizes neste aspecto.

jesus menino foi representado como um alface. bendito fruto que com sua verdura alimenta a esperança no inconsciente coletivo. esperança de que a compreensão entre os homens vá além das prendas desta época onde, empanturrados de bolo rei e outras boas companhias, esquecemos, santa inocência, que estamos justamente a comemorar o nascimento daquele que – se acreditarmos mesmo em sua ressureição – está muito mais preocupado com o abandono de milhões de crianças à fome; sem uma única folha de alface à mesa, do que com a substiutição da imagem idealizada do menino esperança por outra; que de modo algum desvirtuou o sentido hermenêuta da fé, na síntese do binônio fragilidade-força, numa campanha publicitária que cometeu, se muito, o pecado venial de, com apuro estético, inteligência e respeito, promover o espírito natalino de uma forma diferente do sabor experimentado por aqueles que protestaram de barriga cheia. isto sim, uma heresia.

cínico, dirão alguns(estou sendo eufemista para comigo próprio).mas como católico e não católico. publicitário e não publicitário e, acima de tudo, como ser humando, tocado pelo alimento do evangelho, faço pois o meu credo, protestante contra mais esta blasfémia da fé que, com grandiloquente fragilidade em sua tautologia,desvirtuou e desfolhou o alface. lamento que a campanha tenha sido retirada do ar.lLamento a falta de solidariedade entre os iguais. muitíssimo menos como publicitário e majoritariamente como homem que não busca na crucifixão do diferente a expiação dos pecados.

este acto de contrição das amoreiras anuncia que está longe o fim dos tempos dos assassinatos – ainda que “tão-somente Intelecutais”, em nome da fé, da boa fé, dos homens.

não me esquecerei de que, mesmo para os que agiram de má fé, deu-lhes, cristo, o perdão. mas lembrarei também que, estes protestaram contra o alface, colocaram-no na cruz. novamente.

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