domingo, agosto 25, 2013

vamos tratar da saúde






Eu prefiro ser tratado por médicos brasileiros, embora 54,5%  dos 2400 formandos que fizeram a prova do Conselho Regional de Medicina de SP não atingiram a nota mínima. O pior é que os erros se concentraram em áreas básicas. Mesmo assim vão poder exercer a profissão e atender aos infelizes que caírem em suas reprovadas mãos. Mas eu não moro em São Paulo.

Prefiro médicos brasileiros, porque eles são coisa nossa. Por exemplo, a gente liga pra marcar consulta e a telefonista do doutor pergunta: - é particular ou plano? Se for plano, empurram sua consulta lá pra frente. Particular, eles dão um jeitinho. Coisa nossa.

Prefiro médicos brasileiros, porque quando chego ao consultório, fico esperando mais de uma hora pra ser atendido. É porque eles são bonzinhos, gostam de atender a todo mundo, e sabem que ali, no calor apertado da sala de espera, sempre pode rolar uma conversa agradável sobre sintomas e padecimentos com outros médicos. E a socialização é muito importante. Sem contar que podemos adquirir informação, com a leitura daquela Veja em que Airton Senna e Adriane Galisteu ainda estão namorando. Ah, tempo bom! É coisa nossa.
Prefiro médicos brasileiros, porque quando a consulta é particular, eles fazem questão de não dar recibo, ou então a recepcionista pergunta se vou querer a nota fiscal, porque aí o preço é diferente. Não é sonegação, claro que não. É porque eles têm vergonha de espalhar quanto cobram pela consulta. Coisa nossa.

Prefiro médicos brasileiros, porque eles vivem chorando miséria, mas, mesmo assim, no estacionamento dos médicos nos hospitais só tem carrão importado. Parece até pátio de delegacia de polícia. Coisa nossa.

Prefiro médicos brasileiros, porque você faz todo o acompanhamento de sua doença com o doutor do seu plano de saúde, mas na hora da cirurgia, embora ela seja coberta pelo plano, o doutor sempre pede um por fora, pra ele e equipe. Inclusive o anestesista, aquele médico que não é médico, não tem plano, não obedece a sindicatos nem nada. É sempre por fora. É coisa nossa.

Prefiro médicos brasileiros, porque várias vezes você chega ao posto de saúde, a uma emergência ou ao hospital e ele simplesmente não foi trabalhar, e usa de sua criatividade, inventando até dedinhos de silicone, para receber aquele salário que eles dizem que é uma merreca. Mas, isso é mentira, na verdade eles não vão trabalhar porque os hospitais, ambulatórios, as emergências e postos de saúde não dão condições. Eles só não largam o emprego porque têm pena dos pacientes que vão deixar na mão - embora não trabalhem. Pelo menos é o que dizem. Coisa nossa.

Só escrevo este texto, porque tenho vários amigos médicos e, infelizmente, não vejo nenhum deles se levantar contra esse hediondo corporativismo, contra essa maluquice generalizada de que seus colegas cubanos (que trabalham no mundo inteiro) são despreparados e, pior, vão espalhar a ideologia comunista pelo Brasil. Esses médicos que acham que municípios sem médicos têm que continuar assim, enquanto não tiverem infraestrutura, como naquela história da época da ditadura, de que era preciso primeiramente fazer crescer o bolo para depois dividi-lo.

Se os médicos estivessem defendendo seu mercado de trabalho... Mas, não, os médicos estrangeiros só estão vindo ocupar vagas que foram recusadas por seus colegas brasileiros, que não querem trabalhar e também não querem que outros trabalhem. O paciente... ah, o paciente. Ele não é mais paciente, agora é cliente.

Claro que temos ótimos médicos. E muitos deles já se declararam a favor da vinda de seus colegas do exterior.

Temos ótimos médicos, repito. Vários deles trabalhando em condições precárias. Temos muito o que melhorar, e a presidenta Dilma reconheceu o problema em seu pronunciamento na TV:

Quero propor aos senhores e às senhoras acelerar os investimentos já contratados em hospitais, UPAs e unidades básicas de saúde. Por exemplo, ampliar também a adesão dos hospitais filantrópicos ao programa que troca dívidas por mais atendimento e incentivar a ida de médicos para as cidades que mais precisam e as regiões que mais precisam. Quando não houver a disponibilidade de médicos brasileiros, contrataremos profissionais estrangeiros para trabalhar com exclusividade no Sistema Único de Saúde.
Neste último aspecto, sei que vamos enfrentar um bom debate democrático. De início, gostaria de dizer à classe médica brasileira que não se trata, nem de longe, de uma medida hostil ou desrespeitosa aos nossos profissionais. Trata-se de uma ação emergencial, localizada, tendo em vista a grande dificuldade que estamos enfrentando para encontrar médicos, em número suficiente ou com disposição para trabalhar nas áreas mais remotas do país ou nas zonas mais pobres das nossas grandes cidades.

Sempre ofereceremos primeiro aos médicos brasileiros as vagas a serem preenchidas. Só depois chamaremos médicos estrangeiros. Mas é preciso ficar claro que a saúde do cidadão deve prevalecer sobre quaisquer outros interesses. O Brasil continua sendo um dos países do mundo que menos emprega médicos estrangeiros. Por exemplo, 37% dos médicos que trabalham na Inglaterra se graduaram no exterior. Nos Estados Unidos, são 25%. Na Austrália, 22%. Aqui no Brasil, temos apenas 1,79% de médicos estrangeiros. Enquanto isso, temos hoje regiões em nosso país em que a população não tem atendimento médico. Isso não pode continuar. Sabemos mais que ninguém que não vamos melhorar a saúde pública apenas com a contratação de médicos, brasileiros e estrangeiros. Por isso, vamos tomar, juntamente com os senhores, uma série de medidas para melhorar as condições físicas da rede de atendimento e todo o ambiente de trabalho dos atuais e futuros profissionais.

Ao mesmo tempo, estamos tocando o maior programa da história de ampliação das vagas em cursos de Medicina e formação de especialistas. Isso vai significar, entre outras coisas, a criação de 11 mil e 447 novas vagas de graduação e 12 mil e 376 novas vagas de residência para estudantes brasileiros até 2017.  [Fonte]

Mas, o que estamos vendo é que existe um grupo de médicos para quem os cidadãos brasileiros de municípios sem médicos devem sofrer calados ou pegar um ônibus, barca, trem, o que seja, para procurar uma cidade onde um senhoríssimo doutor (brasileiro) o atenda, quando der. A esses lembro que Deus é ironia, e eles podem amanhã ou depois sofrer um acidente, numa pequena cidade, um pequeno município daqueles que ninguém jamais ouviu falar, eu gostaria de saber o que sentiriam ao ouvir alguém lhe falar assim:

- Necesita de ayuda, señor?

(Texto retirado do blog do mello que também sugere a leitura do texto abaixo, do  Luciano Martins Costa, publicado no Observatório da Imprensa)


O que move as entidades médicas


Uma leitura cuidadosa dos principais jornais brasileiros de circulação nacional mostra que há uma tendência da imprensa a desqualificar o programa Mais Médicos, pelo qual o governo federal procura suprir a falta de profissionais de saúde em bairros periféricos das grandes cidades e nos municípios distantes dos grandes centros.
De modo geral, o noticiário abre com informações aparentemente equidistantes da polêmica central sobre o assunto, mas a hierarquia das notícias e as escolhas das análises priorizam opiniões contrárias à iniciativa do governo.
Nas edições de sexta-feira (23/8), a exceção é a Folha de S. Paulo, que dá espaço para um artigo esclarecedor sobre a questão. No Estado de S. Paulo, o principal destaque vai para dados factuais, como o número de cidades paulistas que vão receber médicos selecionados na primeira fase do programa. Nesse texto está inserida a defesa do projeto, sem um destaque especial. As opiniões contrárias estão separadas em dois outros textos, um deles informando que as entidades representativas dos médicos brasileiros e partidos de oposição vão recorrer ao Ministério Público do Trabalho para impedir que se consolide a contratação de estrangeiros.
Abaixo da reportagem principal também é publicado o resultado de uma pesquisa que supostamente mostra que o programa Mais Médicos é rejeitado pela maioria da população. No entanto, esse texto peca pela falta de precisão e acuidade. Por exemplo, não informa de quem é a iniciativa da consulta, feita por um tal Instituto de Ciência, Tecnologia e Qualidade Industrial (ICTQ). Também omite que o ICTQ é uma empresa de educação continuada que é apoiada pela indústria farmacêutica, oferecendo cursos para profissionais do setor.
A “pesquisa” é referendada por um dirigente do Conselho Federal de Medicina, que usa as informações para reforçar a campanha da entidade contra o programa do governo. Trata-se, portanto, de uma daquelas artimanhas do jornalismo segundo a qual um suposto dado objetivo, como o resultado de uma pesquisa, é apresentado como fato comprovador de uma opinião preexistente, omitindo-se do leitor o contexto que lhe permitiria relativizar a informação – no caso, o interesse específico da indústria farmacêutica.
A serviço das farmacêuticas
O Globo nem mesmo se dá ao trabalho de dissimular sua posição: abre a página explorando contradições entre integrantes do governo sobre o salário que os médicos cubanos irão efetivamente receber. No quadro em que o jornal costuma emitir sua opinião, fica claro que seus editores se alinham com o viés mais reacionário das entidades médicas: o texto afirma que “como existe um eixo Havana-Brasília, assentado em simpatias ideológicas, é preciso atenção redobrada na qualidade da prestação de serviço dos companheiros cubanos”.
Assim, em linguagem quase chula, o jornal carioca apoia a ideia de que os médicos cubanos estão sendo trazidos para fazer “pregação comunista”, como entende o presidente do Conselho Federal de Medicina.
A Folha de S. Paulo se destaca por abrir um pouco mais o leque de alternativas do leitor, informando na reportagem principal que o Ministério Público do Trabalho vai investigar as condições da contratação de médicos cubanos. Em outra página, também com destaque, publica a posição do governo brasileiro, manifestada pelo secretário nacional de Vigilância Sanitária e pelo ministro das Relações Exteriores. Há também um perfil dos médicos cubanos que já atuam no Brasil, material acompanhado por um infográfico que mostra a distribuição desses profissionais em todos os estados.
Mas o diferencial da Folha é uma análise produzida pelo jornalista Marcelo Leite (ver aqui), na qual ele observa que Cuba forma milhares de médicos por mês, “como produto de exportação”. O autor explica que o governo cubano montou uma verdadeira indústria de profissionais de saúde, a maioria deles com especialização em medicina preventiva. Esse seria o segredo principal das realizações do regime cubano na área da saúde, como uma taxa de mortalidade infantil inferior à dos Estados Unidos. A ilha comandada pelos irmãos Castro desde 1959 produziu a partir de então 124.789 médicos e se destaca pela prevenção de doenças, diz o articulista.
Esse é o ponto central da polêmica: ao trazer 4 mil médicos de Cuba, o governo brasileiro está sinalizando que sua estratégia para suprir as deficiência da saúde nos lugares mais pobres vai se basear no atendimento preventivo, que reduz sensivelmente os custos do sistema e diminui a dependência em relação às empresas do setor farmacêutico.
O articulista da Folha dá a pista de onde vêm os interesses contrários ao programa do governo, ao afirmar que “na medicina preventiva, sua especialidade, é possível que [os médicos cubanos] se revelem até mais eficientes que os do Brasil, cuja medicina tem outras prioridades”.
Some-se isso com aquilo e... bingo! O leitor já sabe a serviço de quem estão as entidades que se opõem ao programa Mais Médicos.
 

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