Há nomes de cargos muito estranhos. “Brand voice concept creator” (o título que pode ler aqui mesmo em cima, logo a seguir ao nome) é um deles. “O que é que isso quer dizer na prática?”, pergunta você, pessoa do meio ou curioso da vida... e pergunta muito bem. Eu pego na sua pergunta e junto-lhe outra: porque é que alguém, como eu, que era copy (ou copywriter, o criativo publicitário especializado em escrita) abdica de um título tão simples e famoso e escolhe outro, mais longo e esquisito, se não for por masoquismo?
Ultimamente toda a gente fala de emigração. Eu vou falar-lhe de migração. Uma migração parecida com a das zebras e dos búfalos em África, mas mais cinzenta, porque se passa nas células do mesmo nome.
Em 2006, comecei a sentir que o criativo publicitário clássico estava a enfiar-se num guetto. Repare que falei em “sentir” e não em “saber”. Saber, já eu e toda a gente sabia. Os dados estavam à vista. E todos nós os líamos. Era mais uma peça a juntar ao gigantesco comboio de informações que temos a circular cá dentro. Só que, de vez em quando, e por razões que nos escapam, o nosso corpo faz parar o comboio, tira uma informação da carruagem e promove-a a algo mais complexo, a que damos o nome de sentimento. E é então que a coisa se complica, porque um sentimento é uma criança mimada e obriga-nos a lidar com ele. Foi o que me aconteceu.
Ser “copy”, essa coisa mágica que me tinha orientado durante 13 anos da minha vida profissional, de repente passou a saber a pouco. Como “copy” tinha aprendido a criar para 4 meios (televisão, imprensa, rádio, cartazes exteriores), que entretanto tinham perdido relevância e ganho um ar coçado e batido. Melhorá-los era como tentar melhorar uma máquina de escrever.
Estes ex-“fab four” tinham sido tomados de assalto por um tsunami de novos meios, filhos da internet e das novas tecnologias, já neste século. E para esses meios, os criativos tradicionais não sabiam criar. Parecia que só uma nova estirpe de criativos, nascida sob o signo destes meios, podia oferecer a resposta. Só que essa estirpe estava num estágio de pensamento criativo muito embrionário. Até podiam saber criar para um meio específico, mas depois faltava-lhes a capacidade de dar unidade a dezenas de ideias diferentes, para que a marca ganhasse consistência como um todo. Além disto, havia qualquer coisa de profundamente errada em presumir que todo o conhecimento acumulado, ao longo de cento e tal anos de criação, não servia para nada.
O que é que os criativos publicitários tinham, então, de relevante a oferecer a este mundo novo vocacionado para marcas?
Duas coisas fundamentais (que não dependiam de meios específicos): impacto e conceitos. Criativos sempre tiveram uma obsessão absoluta com chamar a atenção das pessoas – uma metodologia muito saudável e muito útil, nesta era em que envolver as marcas com os consumidores se tornou uma questão de vida ou de morte. E sempre tiveram um talento único para criar aquela “cola“ entre ideias a que chamamos “conceito“. Essa cola que faz com que cada nova ideia, nascida num meio diferente, se integre na marca e lhe dê mais força.
Seguindo este fluxo, tornou-se óbvio que os criativos publicitários deviam mudar de posicionamento: de "criadores de campanhas para tv, imprensa, outdoor e rádio" para "criadores de conceitos", algo mais relevante para o futuro das marcas.
Daqui nasceu o "brand concept creator". É na criatividade do pensamento e não na criatividade de um meio específico que está o nosso futuro. No entanto, como um conceito precisa de ideias concretas para descer à terra, o “brand concept creator” intervém também na criação de centenas de pontos de contacto entre a marca e os consumidores.
Ao “brand concept creator” juntou-se o “voice” (a palavra que faltava ao título compridão) porque, na minha agência, faço parte do departamento de brand voice: os “copies” da voz da marca. Aqui também se fazem (de vez em quando) campanhas clássicas, mas faz-se muito mais. Pega-se na marca desde o começo e leva-se até onde se puder (acredite, o gozo está aqui). Começa-se no nome, na voz, na personalidade, na imagem, mas, quando damos por nós, estamos a criar histórias com personagens, enredos, geografias. Seja em sites, jogos online, apps, redes sociais… onde fizer sentido a marca cruzar-se com as pessoas que ela escolheu para conviver.
Éramos criadores de fragmentos da vida da marca e agora somos criadores da vida toda da marca. De atores passamos a autores. Se a função muda, não me parece que o nome que nos define possa ficar igual.
Ou seja e respondendo à pergunta inicial: o “brand voice concept creator” é o criador de conceitos para a voz das marcas. Por enquanto pode soar estranho, mas o futuro soa sempre assim.
brand voice concept quê ? do RICARDO MIRANDA - brand voice concept creator NA BRANDIA CENTRAL ora pois, pois,.queriam que ele se denominasse o quê?
Rapaz, quando você vem a João Pessoa? Como seu leitor assíduo, as vezes me pego batendo papo com os teus textos como se tivesse numa mesa de bar...
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