terça-feira, julho 04, 2006

é muito simples

1. Li o roteiro, fiquei impressionado: cheio de cenas, tomadas as mais diversas. Chamei o redator, propus: vamos simplificar?

Ele não gostou: assim, você vai matar a idéia.

Que idéia, perguntei. Ele tentou responder, não conseguiu. Simplesmente, não tinha uma idéia.

Havia, ali, um emaranhado de cenas. Algumas, até interessantes, é verdade. Mas idéia – pior, raciocínio, com começo, meio e fim – nada.

Além disso, perguntei, cadê o texto?

O redator, agora em companhia do diretor de arte, que naquele dia chegou atrasado, ficou ainda mais indignado. Texto? Pra que texto? As imagens falam por si só.

Pra desgosto deles, recusei o roteiro. Foi, infelizmente, por sinal, o início de uma série de desgastes que culminou com a demissão deles.

2. O pessoal que esteve em Cannes trouxe de lá um recado: sejam simples, apostem na idéia.

Eureka!

3. Simplicidade na propaganda e aposta na idéia não são novidades. Elas vêm lá da década de 60, a partir da bandeira içada nos Estados Unidos pela DDB, com a fantástica campanha criada para o Fusca: fundo branco, o carro, um título fantástico e um primor de texto. Estavam prontos os antológicos saia e blusa. No Brasil, por obra e graça do Alex Pericinoto e do talento do Sérgio Toni, do Hans Damman e do Laerte Agneli, ela se propagou rapidamente.

No entanto a tecnologia e o próprio Cannes foram carrascos com a idéia e a simplicidade.

Lembro-me de quando surgiu o A.D.O., um recurso revolucionário na época, que permitia ao operador de vídeo tape brincar com a imagem. Foi o suficiente para que roteiros e mais roteiros saíssem das agências assim: “homem (ou mulher) fala para a câmera. Usar recursos do A.D.O.” E tome texto, qualquer um servia. E saia o que eu chamo de comercial de engenheiro. Arrumadinho, gelado, vazio de idéia.

Cannes também foi colaborando, na medida em que privilegiava a qualidade da produção, em detrimento da idéia.

4. No Brasil não foi diferente. Rapidamente a idéia foi colocada de lado, e a busca da simplicidade arrefeceu. Resultado: os intervalos comerciais ficaram cada vez mais chatos. Ao contrário do que acontecia antes, o consumidor foi se desinteressando dele, e o anunciante que não é burro, percebeu isso. No entanto...

5. No entanto, uma boa idéia é inesquecível. Faz bem ao produto, ao anunciante, à agência, ao criativo. E apesar disso, é cada vez mais rara. Faça um teste com você mesmo: tente se lembrar de alguns comerciais com grandes idéias publicitárias veiculadas ultimamente. Pessoalmente, lembro-me de muito poucas:

. Bom Bril – um texto fantástico, um grande ator e pronto.

. Brastemp (não é nenhuma Brastemp, não tem comparação) – um texto excelente, um ou dois atores, uma câmera parada, e estamos conversados.

. Brahma – a úmero um, conceito que a agência, criativos e a própria empresa assassinaram para nunca mais encontrar o caminho.

. Hitler – filme feito para a Folha de S. Paulo que, afinal, já não é tão recente assim.

. Valisére, primeiro soutien – tinha uma história, com começo, meio e fim, e muita emoção.

Que mais? Ajude-me aí, o que mais?

6. Vamos levar a sério o recado de Cannes. Consumidor, anunciantes, agências e você vão gostar. Pode parecer complicado, mas não é: bastam talento e vontade de criar. Além do que ter boas idéias, idéias simples, é que nem coceira: basta começar.

cannes, lição número dois, do eloy simões.

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